CONTOS
ESCANDINAVOS
NOTA DO SITE:
É muito difícil identificar de onde uma história popular se originou.
A divisão por continentes, países e regiões é para dar uma ideia da disseminação geográfica das narrativas.
A ÁGUIA DOS OVOS DE OURO
No princípio das coisas... Luonnotar, uma jovem bonita e graciosa, deslizava pelo azul. Há anos, talvez há séculos, ela passeava por essa imensidão celeste. Filha da Natureza, flutuava no espaço infinito e deserto, tendo ao seu redor uma vasta extensão azul. Vivia assim sem sentir falta de nada.
Um dia foi tomada por um grande vazio. Essa sensação foi aumentando cada vez mais. Ela estava cansada de viver solitária. Queria conhecer outros mundos... outros lugares... outras cores...
Muito longe dali um grande mar cobria de infinito toda uma região. Luonnotar quis aventurar-se por essa imensidão. Desceu do seu mundo azul, em grande velocidade, e foi parar no mar alto, para dançar com as ondas. De repente, o vento mostrou sua força, veio uma grande tempestade e fez a jovem experimentar, durante muito tempo, a fúria das ondas. Balançava de lá pra cá como um navio errante.
Com o sossego do vento e a volta da calmaria, Luonnotar percebeu uma nova força. Uma energia que crescia dentro dela: a jovem esperava um filho. Uma criança que só nasceria quando ela criasse um mundo para o receber.
Por nove anos, Luonnotar vagou pelo imenso mar azul buscando um lugar onde criaria o novo mundo. Buscava, sem saber, um porto seguro que acolheria seu filho. O tempo passava e ela continuava na sua busca. Mas não encontrava nada. Já sem forças, sentiu muito frio e chorou. Suas lágrimas pediam piedade ao supremo deus, Ukko, senhor das vastas extensões do ar. Foram tantas as lágrimas que a jovem não conseguia enxergar mais nada. Nem viu a águia de poderosas asas que voava sobre aquele imenso azul do mar. O pássaro também buscava sem sucesso um pouso para o seu descanso. Um lugar para fazer seu ninho. Mas esses mundos azuis, de águas e de ventos, não ofereciam a acolhida necessária. A águia resolveu partir para continuar procurando. E o fez soltando gritos desesperados.
Luonnotar ouviu a angustia da grande ave. Deitou-se de costas para melhor observar o poderoso pássaro. A jovem ergueu um joelho acima das ondas. A águia pousou imediatamente naquela ilha inesperada. Lá ela construiu seu ninho e nele pôs sete ovos: os seis primeiros eram de ouro e o sétimo de ferro.
Com muita calma, a águia chocou os ovos durante três dias. Luonnotar não tinha coragem de se mexer. Ficou imóvel como uma rocha. Mas, no terceiro dia, sentiu uma forte queimadura no seu joelho. A jovem, sem aguentar o ardor, teve que se mexer. Esticou a perna deixando cair os ovos que se quebraram ao bater nas agitadas ondas. Mas, em vez de afundarem, os pedaços começaram a se transformar diante dos olhos encantados da jovem. As cascas dos ovos, tanto as de ouro, como as de ferro, cresceram e tomaram-se gigantescas. Umas subiram tranquilamente para os mundos do ar e ficaram lá, flutuando, formando o arco celeste. As outras foram se agrupando e formando a Terra. As gemas dos ovos também se aglutinaram e transformaram-se no Sol. As brancas claras deram forma a Lua. Milhares de pedaços minúsculos deram origem às estrelas e às nuvens.
Luonnotar continuou a vagar por aquela imensidão do mar durante mais nove anos. Distraia-se vendo a maravilhosa construção que se formou: um novo mundo que a rodeava.
Mas um dia ela cansou. A Terra era reta e monótona. Luonnotar resolveu modelar aquela massa plana para trazer beleza ao novo mundo. Como uma primeira artesã, a jovem utilizou o próprio corpo. Passando o braço, de forma que enrugasse a Terra, criou cadeias de montanhas e vales. Com cuidado modelou as margens batendo de leve com as ancas e também com a testa. Com os pés e as mãos construiu ilhas e rochedos. Deu um mergulho até ao mais profundo abismo do mar e lá escavou precipícios e cavernas. Quando voltou da profundidade marinha, seu corpo pingava gotas de água. Cansada ela deitou sobre a Terra e surgiram nascentes, córregos e rios. Ao levantar, as poças que deixava transformaram-se em lagos.
Quando a tarefa foi toda cumprida, Luonnotar deitou-se e pode dar à luz o filho que trazia dentro de si. Uma gestação, que durou muitos e muitos anos, terminava com o nascimento de um herói: Wainamoinen – o primeiro homem. Aquele que começaria a viver, a desbravar e a semear toda a Terra. Um novo mundo criado pelas mãos poderosas de sua mãe.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
AS FILHAS DO REI
Era uma vez um Rei que tinha doze filhas. E ele gostava tanto delas, que queria sempre estar cercado por suas meninas. O Monarca todo dia tirava uma soneca depois do almoço e esse era o momento que as Princesas saiam para dar um passeio. Claro que as jovens sempre voltavam do passeio antes do pai acordar.
Mas teve uma vez, que o Rei acordou de sua soneca da tarde e as Princesas não voltaram. Pior, elas nunca mais voltaram para o castelo. O Rei ficou desesperado sem entender o que tinha acontecido. Ele enviou mensageiros para procurar suas filhas no seu reino e até em outros reinos, mas ninguém encontrava as Princesas. Com o passar do tempo, o Rei chegou a conclusão que suas filhas tinham sido encantadas por alguma bruxaria.
A notícia do desaparecimento das Princesas correu pelo mundo até chegar a um reino que tinha um Rei com doze filhos. Quando os Príncipes souberam dessa desgraça, pediram permissão ao pai para procurar as Princesas. Mas o Rei não queria dar a licença. O Monarca tinha medo que seus filhos sumissem no mundo e ele nunca mais veria seus meninos. Os Príncipes tanto pediram, tanto imploraram, que, finalmente, ele foi forçado a permitir. Para realizar a tarefa o Rei deu para os Príncipes um grande navio tendo no comando o Capitão Axel Vermelho. Um homem muito estranho, mas que estava completamente em casa no mar.
Então, eles navegaram por muito tempo, sempre desembarcando em cada costa que viam e perguntando sobre as Princesas. Mas ninguém sabia do paradeiro das moças.
Quando passaram sete anos dessa busca, aconteceu uma coisa terrível: uma tempestade. Mas não era uma tempestade qualquer. Era a mais poderosa tempestade que o Capitão Axel Vermelho já tinha enfrentado. Ventos, raios, chuvas com forças inacreditáveis. Todos tiveram que trabalhar duro para que o navio não afundasse nessa tempestade que durou três dias seguidos. Quando a fúria acalmou, todos estavam tão cansados que dormiram no convés do navio. Só o caçula dos Príncipes se manteve acordado. O rapaz quis ficar atento para que nada de mal acontecesse. Ficou andando para cima e para baixo do convés, mas não tinha forças para conduzir sozinho o navio que foi seguindo levado pelas ondas do mar. Até que chegou numa pequena ilha. Do navio, o jovem Príncipe viu um cachorro que latia muito como se quisesse vir a bordo. O caçula foi para o lado da plataforma, e tentou chamar o cão. Assobiou e gritou para ele, mas quanto mais ele assobiava e chamava, mais o cachorro latia e rosnava. O Príncipe ficou com pena do bichinho. Ele achou que o pequeno devia estar passando fome. Talvez fosse de algum navio que tinha afundado por causa da tempestade. O jovem não sabia o que fazer. Não podia deixar o navio sozinho, nem queria acordar todo mundo por causa de um cachorro. Mas, o tempo estava tão calmo que o Príncipe falou para si mesmo:
- Acho que não vai acontecer nada! Vou à praia salvar esse cãozinho!
Então o jovem pegou um bote e remou até a praia. Deixou o bote na areia e foi tentar pegar o cão. Mas cada vez que ele se aproximava o bichinho corria. E foi nesse corre-corre que o jovem se viu diante de um castelo grandioso. O Príncipe ficou fascinado com tamanha beleza, mas ficou completamente encantado quando o pequeno cachorro se transformou em uma Princesa linda. A bela pegou na mão do Príncipe e o levou para o castelo. Lá dentro o jovem teve um grande susto. Viu, sentado num banco, um homem tão grande e feio que faria o mais valente dos valentes tremer. Mas o homem disse assim com uma voz rouca como um trovão:
- Você não tem nenhuma necessidade de ter medo!
Mas aquele vozeirão terrível causou mais medo ainda no caçula dos Príncipes. E o homem continuou:
- Meu nome é Balder e eu sei muito bem o que o trouxe aqui. Você e seus irmãos querem encontrar as filhas do Rei, não é?
- Isso mesmo! - respondeu o rapaz já se enchendo de coragem.
- Eu sei o paradeiro delas! Elas estão com o meu Senhor e Mestre! Cada uma delas está sentada em uma cadeira para pentear os cabelos das doze cabeças de meu Mestre!
- E como posso encontrá-las?
- Você navegou por sete anos! Mas terá que navegar por mais sete para encontrar as Princesas! Navegar sem comando, pois as ondas do mar é que guiaram o seu destino!
- E que tenho que fazer quando encontrar seu Mestre?
- Terá que matá-lo! Ele é uma criatura poderosa e cheia de maldade! Quando ele morrer serei Rei em seu lugar!
- E como matarei esse monstro poderoso?
Balder apontou para uma espada enferrujada que estava pendurada numa parede e disse:
- Você deve usar essa espada mágica!
O jovem Príncipe tentou tirar a espada da parede, mas ela era muito pesada. O rapaz mal conseguia levantá-la. E o homem grande disse:
- Sem magia você não vai conseguir! Minha filha vai ajudá-lo!
A linda Princesa se aproximou do rapaz e colocou em seu pescoço um colar de ouro com uma pedra fosca como pingente. A jovem falou com uma voz muito doce:
- Agora, você deve desejar brandir a espada tão facilmente como se fosse sua!
O Príncipe fez o desejo e a pedra fosca ficou com um brilho intenso. De repente a espada também brilhou, perdeu a ferrugem e ficou leve como uma pluma nas mãos do jovem. E Balder falou:
- Você deve agora voltar para o seu navio. Ao chegar lá, esconda a espada e o colar. O Capitão Vermelho não deve ver esses objetos mágicos. Ele vai cobiçar essas forças, mas não é homem suficiente para empunhá-las. Cuidado com ele. O Capitão Axel Vermelho conhece muitas magias terríveis. É um homem rancoroso e vai tentar acabar com sua vida. Tudo vai acontecer exatamente como já aconteceu: vocês navegaram por sete anos. Uma grande tempestade cairá sobre o navio e quando tudo acalmar um grande sono vai abater toda a tripulação. Então você deve pegar a espada e o colar e ir a terra. Irá encontrar um castelo tendo como protetores lobos, ursos e leões, mas você não precisa ter medo deles. Todos eles vão se agachar aos seus pés. Você deve entrar no castelo e ir até o salão do trono. Lá vai encontrar meu Mestre dormindo, vestido um traje esplêndido e grandioso, cercado pelas Princesas. Cada jovem estará sentada em uma cadeira, penteando as suas doze cabeças. Você deve ser rápido e cortar cada uma das cabeças do monstro antes dele conseguir acordar. Se o Mestre despertar antes da tarefa ser cumprida ele vai engoli-lo vivo! Depois de matar o Mestre, você deve jogar o corpo e as cabeças no mar! Mas importante: os restos do mestre devem ser jogados juntos no mar! Se forem jogadas separadamente o Mestre vai reviver! Você compreendeu tudo?
- Sim! - respondeu o Príncipe.
- Então vá e acabe com toda essa maldade!
O jovem filho do Rei correu para a praia, pegou seu bote e foi para o navio. Os outros ainda estavam dormindo e roncando. O Príncipe escondeu a espada e o colar de modo que nem o Capitão Vermelho, nem os seus irmãos conseguissem encontrar. O vento começou a soprar de novo e o jovem acordou todo mundo. Inventou que tinha sonhado com uma fada que lhe disse que o navio devia seguir por sete anos sem comando para encontrar as Princesas. O capitão Vermelho não gostou daquela história, mas os irmãos do Príncipe acreditaram no sonho e assim foi feito.
Os sete anos passaram e a tempestade veio com força, exatamente como o Balder tinha dito. O mau tempo durou três dias como da outra vez. Quando o vento amansou, um sono terrível se abateu sobre toda a tripulação. Menos no mais jovem dos Príncipes. O rapaz tirou a espada e o colar do esconderijo depois pegou um bote e remou para a terra. Chegando lá procurou o castelo. Até que encontrou um enorme palácio tendo como protetores lobos, ursos e leões. Os guardiões caíram aos pés do Príncipe, e assim ele entrou no castelo. Foi até a sala do trono, encontrou o Mestre dormindo e as doze princesas, sentadas cada uma em sua cadeira, penteando as cabeças. O jovem Príncipe fez um gesto para as Princesas se afastarem. Mas as moças não entendiam o que ele queria. Só a caçula das irmãs é que entendeu o que o Príncipe estava pedindo. Ela lançou um doce olhar para o rapaz que ficou encantado com sua beleza. Com gestos, a linda moça explicou para as irmãs o que o Príncipe queria. As Princesas entenderam e saíram do caminho. O rapaz, mais rápido que ele podia, cortou as cabeças do Mestre. O sangue ficou jorrando como um grande riacho. O Príncipe tentou pegar os restos do monstro para jogar no mar, mas era tudo muito grande e pesado. Ele foi até o navio, acordou todo mundo e pediu ajuda aos irmãos dizendo que tinha encontrado as Princesas, matado o monstro e precisava jogar no mar os seus restos. Mas todos riram dele sem acreditar. Diziam:
- Você deve ter sonhado como da outra vez!
O filho mais novo do Rei pediu que os irmãos o seguissem para verem que era tudo verdade. Os Príncipes e o Capitão Vermelho foram a terra e viram o riacho de sangue, o castelo, o monstro e as lindas Princesas. Juntos pegaram os restos do Mestre e atiraram no mar.
Tudo agora era só alegria para os irmãos. Dentro do castelo, os Príncipes encontraram muito ouro e prata que levaram para o navio. Quando a embarcação já ia zarpar a mais nova das Princesas falou:
- Esperem! Nossas coroas ficaram no palácio! Precisamos delas! Elas são mágicas e mostram a verdade!
Mas o Capitão Axel Vermelho não gostou:
- Não precisa! Temos ouro e prata suficientes aqui para fazer muitas coroas!
Os príncipes concordaram com o Capitão e nenhum deles estava disposto a voltar no palácio para pegar as coroas. Só o filho mais novo do Rei, que já estava apaixonado por aquela linda Princesa, quis realizar a tarefa.
- Eu vou pegar as coroas! Onde elas estão?
A jovem ficou feliz:
- Estão na sala do trono num baú de madeira!
- Eu vou lá buscar! Esperem por mim! Eu já volto!
Os Príncipes concordaram. O rapaz entregou o seu colar e a espada para sua amada. Depois tomou um bote e foi para a terra. Quando ele estava tão longe que não podiam mais vê-lo, o Capitão Vermelho arquitetou um plano. Ele queria ser o líder e casar com a mais nova das Princesas. Foi até o seu quarto e preparou uma poção mágica de esquecimento. Misturou a poção ao vinho e serviu para todos dizendo que queria comemorar. Todos beberam e esqueceram o jovem Príncipe. Só a amada do rapaz não bebeu. Fingiu que brindava e jogou aquele vinho fora. O Capitão Vermelho inventou a história que ele tinha salvado as Princesas e era dono de todo aquele ouro e prata. Todos acreditaram. Só a mais nova das Princesas sabia da verdade. Mas ela preferiu se calar na certeza que seu amado voltaria para salvá-la. Sendo assim o navio partiu.
Enquanto isso, o filho caçula do Rei remava para terra. Chegou à praia e foi para o castelo. Encontrou as coroas no baú da sala do trono. Juntou todas as coroas e voltou para a praia. Foi remando no bote, mas quando ele chegou onde deveria estar o navio, não encontrou nada. Sem saber o que fazer, voltou para a praia. Ele ficou desesperado. Não tinha para onde ir e resolveu dormir, pelo menos aquela noite, por lá. Ficou com um pouco de medo de ficar sozinho no castelo por toda noite, mas não tinha nenhuma outra casa naquele lugar. Foi para lá e trancou todas as portas e portões. Deitou-se em um quarto onde tinha uma cama pronta. Quando estava quase dormindo escutou alguma coisa que rangia e gemia. O teto e a parede começaram a tremer como se todo o castelo estivesse sendo quebrado. Apesar do medo, o Príncipe levantou e se colocou em guarda. De repente, o jovem ouviu uma voz que falava assim:
- Não tenha medo! Preciso de ajuda!
O Príncipe se armou de coragem e respondeu:
- Aqui estou eu! Posso ajudar no que for possível!
- Então durma e amanhã vá ao celeiro. Pegue quatro barris de centeio para mim. Preciso comer isso no café da manhã! Você me ajuda?
O jovem concordou e foi dormir. Quando ele acordou, viu ao seu lado um pássaro enorme. Maior que um cavalo. O pássaro era preto com uma grande pena vermelha no alto da cabeça. Então, o filho do Rei desceu ao celeiro, pegou os quatro barris de centeio e deu para o pássaro. Depois que comeu a grande ave disse:
- Agora quero lhe ajudar! O que posso fazer?
- Preciso sair daqui! Preciso ir até um reino distante!
- E onde fica esse reino?
- E o castelo de Balder!
O pássaro conhecia o castelo.
- Sei onde é! Você vai montar em mim! Segure com força na minha pena vermelha para não cair!
O Príncipe colocou as coroas dentro de um saco de pano, montou no pássaro e segurou com força na pena vermelha. Então, a grande ave alçou voo. O vento assobiava. O Príncipe viu o mar lá de cima. O pássaro batia as poderosas asas com força. Rapidamente, lá de cima, o jovem pode ver o barco. Depois de um tempo, chegaram à ilha, onde Balder tinha um castelo. O filho mais novo do Rei foi recebido de uma forma bem calorosa. O agora Rei Balder só era gratidão pelo jovem ter matado o Mestre. Ofereceu metade de seu reino e a mão de sua filha em casamento. Mas o coração do rapaz já tinha dona. Ele já estava completamente apaixonado pela mais jovem das doze Princesas. O mais moço dos Príncipes só desejava reencontrar seu amor. Balder, com sua voz de trovão, pediu que ele tivesse calma:
- Não se preocupe, meu amigo! Você terá que ter paciência! Saiba que sua amada também só quer reencontrá-lo! Toda noite ela coloca sua espada ao seu lado na cama. Ninguém tem coragem de se aproximar dela!
O Príncipe sabia porque o Rei Balder estava dizendo isso. Era por causa do Capitão Vermelho. E o Monarca continuou:
- Você terá que esperar aqui! O navio vai demorar a chegar ao Reino das doze Princesas! E terá que tomar muito cuidado! O Capitão Vermelho encantou todos com uma poção de esquecimento! Só sua amada se lembra de você! Ninguém mais!
Por anos o mais novo dos filhos do Rei esperou com angustia. Tinha medo que sua amada o esquecesse. O tempo passou como o vento. No final de sete anos o Rei Balder disse ao jovem Príncipe:
- Agora está na hora de você ir ao reino de sua amada! Mas não esqueça: vá com cuidado, meu nobre amigo! O Capitão Vermelho encantou seus irmãos!
O Rei Balder deu muitos presentes para o jovem Príncipe. Ouro e prata que o tornavam muito mais rico que todos os seus irmãos juntos. Mas o Príncipe ficou preocupado:
- Como vou carregar isso tudo, meu amigo?
O Rei fez um gesto mágico e todo aquele tesouro ficou bem pequeno que coube numa pequena caixa. O Príncipe colocou a caixa no bolso e o Monarca disse:
- Quando quiser o seu tesouro, basta quebrar a caixa que ele volta a ser grande!
O Príncipe despediu-se do Rei Balder e de sua filha. Montou novamente no grande pássaro e eles chegaram rápido ao reino de sua amada. Na praia, o pássaro deixou o jovem e voltou para as suas terras. O príncipe armou um plano: vestiu-se como um pobre marinheiro e colocou nas costas o saco com as coroas das Princesas. Foi bater numa casa simples e pediu pousada. Na casa morava uma velha fofoqueira que veio bem a calhar para os planos do Príncipe. O jovem contou para a mulher que tinha visto as Princesas e que sabia onde elas estavam, mas pediu segredo. Pediu de propósito, porque sabia que essa informação ia coçar na boca da velha. Não demorou muito a fofoqueira saiu contando por todo lado a história do falso marinheiro. Rápido como fogo, a notícia se espalhou e foi parar nos ouvidos do Rei, pai das moças. O Monarca mandou chamar o marinheiro para saber se era verdade o que diziam.
O Príncipe, ainda vestido de marinheiro, foi até o palácio. Mesmo com os humildes trajes foi recebido pelo Rei e contou o que sabia:
- Senhor meu Rei, sei onde estão suas filhas! Mas logo tudo vai se resolver, pois as Princesas já estão chegando!
Foi o jovem falar isso que os soldados entraram na sala do trono anunciando a chegada de um navio. O Príncipe disse ao Rei:
- Senhor meu Rei, esse navio está trazendo as suas filhas! Mas antes de se encher de alegria, pergunte ao Capitão Axel Vermelho quem salvou suas filhas e escute o que ele tem a dizer! Depois escute e veja o que eu vou fazer!
Sem saber a razão, o Rei confiou nas palavras daquele marinheiro. Logo entraram na sala do trono as Princesas, os Príncipes e o Capitão Vermelho. O Rei quase explodiu de tanta felicidade. Abraçou as filhas entre lágrimas, mas logo se lembrou das palavras do marinheiro. Então perguntou:
- Quero saber quem salvou minhas filhas?
O Capitão Axel Vermelho foi a frente do Rei e declarou:
- Fui eu, senhor meu Rei! Enfrentei um terrível monstro de doze cabeças que aprisionava as Princesas! Só peço, como pagamento, metade de seu reino e a mão de sua caçula em casamento!
Nesse momento, o Príncipe, ainda com a roupa de marinheiro, falou:
- É mentira, senhor meu Rei! Fui eu que salvei suas filhas! Não peço nada como recompensa! Só serei eternamente feliz se a sua caçula me aceitar como esposo!
O Capitão Vermelho ficou furioso e avançou sobre o jovem:
- Como ousa, marinheiro miserável! Quem é você para dizer isso?
- Não sou marinheiro! Sou um rico Príncipe!
O jovem disse isso, tirou do bolso a caixinha e a atirou no chão. A caixinha se fez em pedaços e de dentro saiu um tesouro tão grande que encheu o castelo de ouro e prata. Todos ficaram espantados. O Príncipe tirou as roupas de marinheiro e mostrou sua verdadeira face.
- Sou o irmão caçula desses Príncipes e fui eu que salvei as Princesas!
O Capitão bufava:
- Mentiroso! Você deve ser um bruxo e merece morrer! Tenho aqui testemunhas de minhas façanhas! Os Príncipes e as Princesas que sabem que digo a verdade!
O jovem filho do Rei não perdeu a calma. Disse ao Monarca:
- Senhor meu Rei, esse homem mente! Ele deu uma poção mágica para suas filhas e meus irmãos beberem!
- Isso é outra mentira! - esbravejou o Capitão
- Não é! E vou provar!
O Príncipe tirou da sacola as coroas e colocou nas cabeças das Princesas. Logo o encanto das Princesas acabou. Só a sua amada não precisava da coroa. Cheia de paixão, ela abraçou o seu salvador. Os irmãos do jovem Príncipe entenderam o que estava acontecendo e o encanto deles também teve fim. O Rei mandou prender o Capitão Vermelho e houve uma grande festa. Não apenas um casamento, mas doze casais que juraram amor eterno e viveram felizes por muitos e muitos anos.
Reconto de Augusto Pessôa
In: A Panqueca Fugitiva, o Resmungão e outros contos nórdicos.
É MENTIRA!
Era uma vez, em algum tempo, um Rei que tinha uma filha. Mas o monarca vivia triste. É que a Princesa se orgulhava de ser uma grande mentirosa e de nunca dizer a verdade. O pai não gostava nem um pouco dessa fama da filha e por isso fez um decreto:
- “Quem contasse uma mentira maior que as mentiras de sua filha e ainda a fizesse dizer a verdade ganharia metade de seu reino e a mão da Princesa!”
Muitos homens tentaram. Todos queriam ganhar metade daquele vasto reino e ainda se casar com a Princesa que, apesar de mentirosa, era linda que dava gosto de ver. Mas ninguém conseguia. A bela Princesa parecia imbatível.
Bem perto do castelo moravam três irmãos muito pobres. Os rapazes mais velhos decidiram tentar a sorte. O caçula quis ir também, mas os outros não deixaram. Eles é que iriam tentar vencer a Princesa. E foram. Chegaram no castelo, e o primogênito se apresentou, ao Rei e sua filha, dizendo:
- Quero dizer, ao senhor meu Rei e a sua bela filha, que tenho tanta força nos dentes que consigo mastigar uma barra de ferro como se fosse água! Acredita nisso, minha bela Princesa?
A Princesa deu um suspiro e fez pouco caso:
- Claro que acredito! Eu mesmo tenho um touro que mastiga ferro, prata e ouro! Depois ele cospe tudo em forma de jóias! Os meus mais ricos anéis, pulseiras e tiaras foram todos cuspidos por ele!
O rapaz baixou a cabeça. Mas o irmão do meio tomou a palavra:
- Senhor meu Rei e bela Princesa, meu irmão tem força nos dentes, mas eu tenho grande força nos braços! Levanto com um braço duas carroças cheias de ouro e com o outro mais duas cheias de prata. A linda Princesa acredita nisso?
E a jovem suspirou de novo:
- Não vejo dificuldade em acreditar nisso! Outro dia, esse meu touro sozinho trouxe para terra vinte navios repletos de ouro, prata e diamantes!
O irmão do meio ainda insistiu:
- Isso não é vantagem! Um touro é mais forte que um homem! Pode realmente arrastar navios até o porto!
A Princesa riu:
- Mas não foi só até o porto! Ele arrastou os navios até o castelo! As embarcações fizeram sulcos na terra que se encheram da água do mar e transformaram-se em rios! Ah... e os navios foram desmontados! Suas madeiras ajudaram a construir várias casas do reino!
O irmão do meio também baixou a cabeça. Os dois derrotados voltaram para casa.
E aí foi a vez do caçula. Ele partiu para o palácio e se apresentou ao Rei. Disse que realizaria a tarefa, mas não ali na sala do trono. Queria encontrar a Princesa no estábulo. Pediu ao Rei e sua corte para ficarem escondidos e ouvir tudo. E assim foi feito.
O Monarca arrumou um jeito de mandar a filha ao estábulo. Ele e sua corte ficaram escondidos para ouvir tudo. E o caçula apareceu na frente da Princesa que estava cuidando de um touro enorme.
- Bom dia, bela Princesa!
- Bom dia! - respondeu a jovem.
O rapaz olhou para aquele bicho imenso e desdenhou:
- Que touro mais pequenino, Majestade! Uma vergonha para o estábulo real! Acho que nunca vi um touro assim tão pequeno!
A Princesa ficou espantada. O touro era enorme. Mas a moça disfarçou e foi dizendo:
- É verdade! Também acho ele tão pequeno! Ainda mais comparado com uma vaca que eu tenho!
- Ela é grande? - perguntou o rapaz.
- Enorme! - respondeu a bela – Tão grande que todo dia enche de leite quatro tonéis que são maiores que o palácio do Rei!
E o rapaz falou alto:
- Ah... Então é isso!
- Isso o que? - quis saber a jovem Princesa.
E o rapaz continuou explicando. Falava sem parar nem para respirar:
- Eu encontrei um desses tonéis! Como não sabia o que tinha dentro, fiquei curioso! Arrumei uma corda muito comprida! Tão comprida... mas tão comprida... que folgada dava três voltas no mundo todo! Tirei um pedaço da corda e mandei um beija-flor amarrar a ponta no alto daquele tonel! Subi com dificuldade, mas consegui chegar lá no alto e quase cai no leite! Quase me afoguei! Fui salvo pelo vento Norte que soprou seu ar quente e fez o leite ferver! Fui subindo com o vapor até chegar numa nuvem. Fiquei por lá um tempo. Era macio, sabe? Uma delícia! A nuvem era toda feita de pluminhas tiradas das asas de pombos brancos! Por mim eu ficava morando lá até hoje! Já tinha feito até uma cama, um sofá e um armário de plumas de pombo! Até que o vento Norte veio de novo. Ele não gostou de me ver lá, porque aquela nuvem toda era a cama dele. O vento também precisa descansar, não é? Ele me botou pra correr! Fui pulando de estrela em estrela até que cheguei à lua. Estava com uma fome louca! Mas como todo mundo sabe... a lua é feita de queijo e pude me alimentar. Já estava chateado de comer tanto queijo quando passou um cometa. Agarrei no rabo do cometa e fui guiando o danado até ficar justinho em cima do tonel de leite! Larguei a cauda do astro celeste, achei que ia cair no leite e me salvar. Mas o vento Norte, que estava dormindo e roncando, bufou justamente quando eu ia passando por sua nuvem! Desviou meu caminho, né? Aí, eu caí num buraco que era a toca de um casal de raposas. Mas eu fiquei feliz porque as raposas eram o seu pai, o Rei, junto com sua mãe, a Rainha! E eu ainda dei mais sorte: todo mundo sabe que o seu pai não toma banho, não é? E imagina que caiu uma semente de figo na cabeça dele e cresceu uma figueira. E a árvore estava uma beleza! Cheia de figos maduros! Foi muito bom porque a minha viagem foi longa e eu estava de novo com fome. Foi só colher os figos da cabeça do seu pai para comer e depois...
O rapaz não pode continuar. Furiosa a bela Princesa gritou:
- Meu pai toma banho todo dia e nunca cresceu figo na cabeça dele!
O Rei e a corte saíram do esconderijo na maior festa. O rapaz venceu! O caçula dos irmãos ganhou a metade do reino e a mão da Princesa que, desse dia em diante, nunca mais mentiu.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
In: A PANQUECA FUGITIVA, UM RESMUNGÃO E OUTROS CONTOS NÓRDICOS
Ed. ROCCO
HAROLDO
Era uma vez uma mulher que tinha um filho pequeno e muito gordo. O menino, que se chamava Haroldo, adorava comer do bom e do melhor. E a mãe vivia fazendo comidas gostosas para o seu filho.
Certa vez, ela estava assando um porco quando o cachorro da casa começou a latir.
- Haroldo, meu filho! - disse a mulher – Vá ver porque o cachorro está latindo!
Então o menino foi e viu na porta de casa uma velha, muito feia, com um saco nas costas. Era mesmo uma bruxa troll. O menino ficou com medo, mas a bruxa falou assim:
- Bom dia!
- Bom dia! - respondeu Haroldo.
- Você pode me ajudar, meu menino? - perguntou a bruxa troll.
- Não sei! O que a senhora quer que eu faça?
- Ajude a vovó a carregar o seu saco! - disse a velha.
- E o que eu ganho com isso? - quis saber o menino.
A velha tirou do bolso uma linda faca e disse:
- Dou pra você essa faca de prata!
Haroldo aceitou a faca e foi ajudar a bruxa. Mas, quando o menino chegou perto do saco, a malvada jogou o gordinho lá dentro. A velha troll colocou o saco nas costas e foi andando pela estrada. Até que a bruxa cansou. Botou o saco no chão e deitou embaixo de uma árvore para descansar. Haroldo pegou a faca de prata e abriu um buraco no saco. Ele saiu de lá, colocou no seu lugar uma grande pedra e correu para casa da sua mãe.
A bruxa troll acordou e seguiu seu caminho achando que estava levando Haroldo dentro do saco. Quando ela chegou em casa, viu o que tinha trazido e ficou com muita raiva.
No dia seguinte, a mãe de Haroldo estava cozinhando de novo, quando o cachorro voltou a latir.
- Meu filho! - disse ela – Vá ver porque esse cachorro está latindo tanto!
O menino foi ver e era a bruxa troll de novo.
- Bom dia! - disse a bruxa.
- Bom dia? - respondeu Haroldo – O que você quer? Quer me prender no saco de novo?
- Não, meu filho! - respondeu a velha – Aquilo foi uma brincadeira! E para o menino não ficar chateado, tenho aqui uma colher de prata linda que eu quero dar para você!
A velha disse isso e tirou do bolso uma linda colher. Quando Haroldo foi pegar o presente, a mulher deixou cair no chão o objeto.
- Ai! Desculpe! - disse a velha bruxa troll – Não consigo abaixar! Minhas costas doem! Pegue pra mim, meu filho!
Haroldo abaixou para pegar a colher. A velha agarrou o menino com força e o jogou dentro do saco. A bruxa colocou o saco nas costas e partiu para casa tão rápido quanto suas pernas podiam levá-la. Mas ela cansou de novo. Botou o saco no chão e deitou embaixo de uma árvore para descansar um pouco. Enquanto ela dormia, Haroldo fez um buraco no saco e saiu. Colocou uma pedra maior que a primeira no lugar e foi para casa. A bruxa acordou e correu para sua casa. Quando chegou lá, ela colocou uma panela grande no fogo para cozinhar Haroldo. Quando a água estava fervendo, a bruxa pegou o saco e jogou o que tinha dentro na panela. A pedra grande fez um buraco no fundo da panela. A velha bruxa ficou numa fúria terrível e disse:
- Ah! Amanhã esse garoto não me escapa!
No dia seguinte, aconteceu exatamente como das outras vezes. O cachorro começou a latir e a mãe pediu que Haroldo fosse ver o que era. E o menino deu de cara com a bruxa:
- Bom dia! - disse a bruxa.
- A senhora de novo! - falou Haroldo – Não tem vergonha?
A velha bruxa deu um sorriso amarelo e disse:
- Que é isso, meu filho? Que palavras tão duras! Aquilo foi só uma brincadeira! E para o menino não ficar chateado, eu tenho aqui um garfo de prata para você!
A bruxa tirou do bolso um garfo, que era bonito que dava gosto de ver. Haroldo pegou o presente e ficou encantado com os desenhos delicados no cabo do garfo. Ficou muito distraído com aquilo. Então, a velha agarrou o menino e o jogou dentro do saco. A bruxa saiu correndo levando Haroldo nas costas. Dessa vez, ela não parou para descansar. Foi direto para casa. Quando chegou, ela disse para a filha:
- Ponha a panela no fogo! Vamos ter uma boa comida no jantar! Você vai matar esse menino! Depois cozinhe ele na panela! Não se esqueça de temperar bem! Eu vou na igreja chamar seu pai para o jantar!
A velha bruxa troll saiu.
Por estranho que pareça, a filha da bruxa não era troll. Puxou ao pai que também não era. Mas ela era tonta de doer. A moça não sabia fazer nada. Muito menos como matar Haroldo. Sem perceber ela disse alto:
- Eu não sei como é que eu vou matar esse garoto...
Haroldo ouviu isso, teve uma ideia e falou para a jovem:
- Espere um pouco! Eu ajudo! Vou mostrar como você deve me matar! Coloque sua cabeça em cima daquela mesa que eu ensino como deve fazer!
Assim, a coitada da moça deitou a cabeça sobre a mesa. Haroldo pegou um machado e cortou a cabeça dela. Ele colocou a cabeça na cama e ajeitou para parecer que a moça estava dormindo. Depois colocou o corpo na panela com bastante tempero e deixou aquilo ferver. O garoto procurou onde a velha bruxa guardava seu tesouro e encontrou um quarto cheio de peças de ouro e prata. Uma fortuna digna de um Rei. Fechou a porta do quarto, depois pegou as pedras que tinha colocado no saco da bruxa e subiu no telhado da casa.
Quando a bruxa voltou da igreja com o marido, viu a cabeça na cama e pensou que sua filha estava dormindo. A velha troll preparou a mesa e o marido perguntou:
- O que temos para comer?
- É caldo de garoto gordo! - respondeu a bruxa
No alto do telhado Haroldo disse baixinho:
- É caldo de filha de bruxa!
Então o marido e a velha bruxa tomaram todo aquele caldo. Terminado o jantar o homem disse:
- Esse caldo de garoto gordo estava uma delícia!
Em cima do telhado, Haroldo começou a rir alto. A velha bruxa troll não gostou.
- Quem é que está rindo tanto? - quis saber a velha.
E lá no telhado o menino perguntou:
- O quê é que vocês comeram?
- Caldo de garoto gordo! - respondeu o casal.
Haroldo deu uma nova gargalhada e disse:
- Não! Vocês comeram caldo de filha de bruxa!
A bruxa foi acordar a filha e viu que na cama só tinha a cabeça. O casal enfurecido saiu de casa para acabar com Haroldo. Quando eles saíram, o menino jogou as pedras na cabeça dos dois. A bruxa e seu marido morreram ali mesmo. Depois o garoto desceu do telhado e pegou todo o ouro e a prata que estavam naquele quarto. Foi para casa de sua mãe e se tornou um homem muito rico que viveu feliz para todo sempre.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
MANUEL FEIJÃO
Um casal vivia muito triste por serem já velhos e não terem filhos. Era tanta tristeza que a mulher disse uma vez:
- A coisa que eu mais queria neste mundo era ter um filho! Mesmo que ele fosse do tamanho de um feijão!
Passou um tempo e, quando menos se esperava, a velha teve um filho. Mas era tão pequenininho, tão miudinho, que era mesmo do tamanho de um feijão. Mas o casal ficou feliz assim mesmo.
Criaram o menino e puseram o nome de Manuel Feijão.
A mãe nunca tirava os olhos dele porque ele era muito pequeno. Mesmo assim, muitas vezes perdia o seu filho.
Certa vez, ela foi dar comida aos bois e levou o pequeno. No meio do serviço perdeu o Manuel Feijão e um dos bois engoliu o miúdo. A pobre mulher ficou desesperada e começou a gritar por toda a parte:
- Manuel Feijão! Manuel Feijão!
E o pequeno respondeu de dentro da barriga do boi:
- Tuím! Tuím! Tô aqui, minha mãe!
- Manuel Feijão, onde você está?
- Tuím! Tuím! Dentro da barriga do boi, minha mãe! Mas já vou sair!
A mulher ficou aparando tudo que o boi fazia e assim encontrou Manuel Feijão todo sujinho. Lavou o menino muito bem lavado. Mas o pequeno era muito levado, não tinha medo dos bois. Não tinha medo de nada. Queria até levar os bois para o pasto. Entrava no nariz de um dos bois. Assim os guiava para pastar e voltar para casa.
Certa vez, ele estava no pasto, resolveu descansar numa folha de arbusto e adormeceu. Uma cabra, que pastava por ali, começou a comer as folhas desse arbusto e engoliu Manuel Feijão. A mãe dele ficou muito aflita porque o pequeno não aparecia.
Na barriga da cabra, Manuel Feijão começou a dar chutes e socos. O pobre animal, com muitas dores de barriga, corria por todo lado. Terminou indo dar na horta dos pais do Manuel. O lavrador tomou um susto ao ver aquele bicho correndo de um lado para outro. Achou que o animal estava possuído por alguma maldade e deu um tiro que matou a cabra de uma só vez. Depois jogou a pobre no meio da estrada.
Veio de noite um lobo e comeu as tripas da cabra, e lá se foi Manuel Feijão aos tombos para dentro da barriga do lobo.
Mas o pequeno era danado. Começou a dar voltas nas tripas do animal. O lobo, com muitas dores, subiu numa árvore sem saber o que fazer. Nisso vieram uns ladrões que puxavam um cavalo carregado com sacos de dinheiro. Manuel Feijão tanto buliu com o lobo que o animal se atirou lá de cima e veio arrebentar em pedaços no chão. Foi um barulho tremendo que os ladrões fugiram espantados deixando para trás o dinheiro. Manuel Feijão, meio tonto, saiu das tripas do lobo e subiu pelas pernas do cavalo. Entrou em sua orelha e começou a beliscá-lo. O pobre do bicho ficou desesperado e começou a correr sem destino. Com esforço, Manuel conseguiu guiar o animal para a casa dos pais. Chegou na porta, ainda de noite, e começou a fazer muito barulho. Os velhos assustados perguntaram de dentro da casa:
- Quem é que está aí?
- Tuím! Tuím! É Manuel Feijão!
A mãe conheceu a voz de seu filho e correu para abrir a porta. Tirou Manuel da orelha do cavalo, abraçou e beijou o pequeno. Depois foi lavar sua sujeira. O pai tirou do cavalo os sacos de dinheiro e os três viveram felizes por muitos anos.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
MINDINHO
Era uma vez uma mulher que tinha um único filho e ele era bem pequeno. Do tamanho do menor dedo da mão. Por isso todo mundo o chamava de Mindinho.
Quando ele ficou mais velho, o suficiente para saber o certo e o errado, a mãe disse para o rapaz sair e conquistar uma noiva. Ele era pequeno, mas bonito que dava gosto de olhar. O rapaz já ia embora, mas a velha mãe ficou preocupada e foi junto com ele. A mulher colocou o filho entre os seios e eles partiram. Andaram bastante. A mãe queria levar o rapaz até um palácio que tinha uma princesa linda, mas muito alta. Com mais de três metros de altura.
Durante a viagem eles pararam num descampado onde pastava um cavalo. Mindinho pediu para mãe levá-lo até o cavalo. A mulher assim fez e depois ficou por ali descansado. Quando ela acordou procurou pelo filho, mas não achou. A pobre começou a chorar e gritar chamando pelo filho.
- Aqui estou! – disse o Mindinho que tinha se escondido na crina do cavalo.
A mulher ficou nervosa e o rapaz deu sua palavra que não se esconderia mais. A mãe de Mindinho montou no cavalo e eles partiram. Mas, quando eles tinham andado bastante, o mocinho se perdeu novamente. A velha mãe ficou desesperada até que o rapaz saiu da orelha do cavalo.
- Estou aqui, minha mãe! Não se preocupe!
Então, ele teve que dar de novo a palavra de que não iria mais se esconder. Mas mal eles andaram um pouco e o pequeno sumiu de novo. A mãe ficou mais desesperada ainda, até que o rapaz saiu de dentro da narina do cavalo.
- Não se preocupe! Estou aqui!
Então, a mãe colocou o rapaz dentro de um saco para que ele não se escondesse mais. Dessa forma eles chegaram no palácio da princesa grande.
A bela e alta jovem ficou encantada quando viu aquele homem tão pequeno e lindo. Assim, o casamento foi logo acertado. Uma festa maravilhosa. Depois da cerimônia, os noivos e seus convidados foram jantar. Mindinho sentou do lado de sua noiva, mas ele não conseguia alcançar a mesa. A Princesa o ajudou colocando o noivo em cima da mesa. Mas Mindinho era teimoso e queria comer sozinho. Sentou na beira de uma tigela cheia de mingau e viu um punhado de manteiga derretendo do outro lado do prato. Ficou com muita vontade de comer aquilo. Foi andando pela borda, se equilibrando até alcançar a manteiga. Mas quando ele estava quase chegando, a Princesa, sem prestar atenção, enfiou uma colher grande no mingau. O Mindinho perdeu o equilíbrio e caiu dentro manteiga. Como aquilo estava quente, o coitado morreu queimado e afogado. A Princesa, quando viu o que tinha acontecido ao seu lindo e miúdo marido, chorou sua tristeza de viúva.
E acabou a história.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
O FERREIRO LARS
Nos dias em que Jesus e São Pedro costumavam andar pela terra, eles chegaram na casa de um ferreiro. Esse homem se chamava Lars e tinha feito um negócio com o diabo. O tal acordo dizia que o ferreiro por sete anos seria o maior mestre de seu ofício, mas no final desse tempo o demônio viria buscar sua alma. O negócio tinha sido feito em papel especial onde, tanto Lars como o diabo, tinham assinado seus nomes.
Depois o homem botou na porta de casa uma placa que dizia:
“Aqui trabalha o mestre de todos os mestres."
Quando Jesus passou pela porta e viu aquela placa quis saber quem morava lá. E o ferreiro Lars respondeu de uma forma bem agressiva:
- Quem é você? Porque quer saber de mim? Não leu o que está escrito na porta? Mas talvez você não saiba ler, nem escrever! Se assim for, você deve esperar até que alguém venha para ajudá-lo! Eu não tenho tempo para perder com você!
Antes que Jesus tivesse tempo para responder, chegou um homem com seu cavalo. O animal tinha as pernas muito feridas. O cavaleiro pediu para o ferreiro Lars trocar as ferraduras do pobre bicho, mas Nosso Senhor perguntou para o que se dizia grande mestre:
- Posso fazer o serviço?
- Você pode tentar, se quiser! - disse o ferreiro – Mas não faça nada tão errado que eu não possa consertar depois!
Então Jesus foi até o animal e o fez deitar. Tirou as pernas do cavalo e colocou no forno. Quando as pernas estavam vermelhas de calor, Jesus as tirou do forno e deixou esfriar. As pernas ficaram novinhas como de um cavalo jovem. Jesus colocou as pernas de volta no bicho, que deu um salto e ficou bom que só vendo. O cavaleiro, espantado com tudo aquilo, agradeceu muito e foi embora. O tempo todo o ferreiro Lars estava só observando até que disse:
- É... até que você não é tão ruim assim como ferreiro!
- Ah... você pensa assim, não é? - respondeu Jesus.
Nesse momento a mãe de Lars apareceu. Era uma mulher muito velha e enrugada que estava quase morrendo. A pobre velha mal se aguentava nas pernas. E Jesus falou para o ferreiro:
- Vou mostrar que ainda posso ser melhor!
Então Jesus pegou a mulher velha e colocou no forno. Depois tirou a criatura de lá e deixou esfriando. A mãe do ferreiro se transformou numa jovem e linda donzela. Lars ficou espantado, mas ainda insistiu:
- Bem... Eu digo agora, como eu disse antes, você não é um ferreiro tão ruim!
O homem e sua jovem mãe convidaram São Pedro e Nosso Senhor para jantar. Depois de comer, os convidados ficaram descansando e o ferreiro voltou para o seu trabalho. Apareceu um novo cavaleiro querendo que o seu animal fosse ferrado.
- Vai ser feito num piscar de olhos! - disse Lars – Aprendi uma técnica maravilhosa!
O ferreiro disse isso e cortou as pernas do cavalo, sob o olhar espantado do cavaleiro. Depois colocou as pernas no forno. As pernas queimaram até virarem cinzas. O cavaleiro ficou furioso e Lars teve que pagar pelo cavalo.
Bem... ele não se importou muito com isso. Era teimoso e queria usar a nova técnica. Nisso uma velha mendiga veio andando pela estrada. Quando Lars viu a mulher, deu um pulo e falou:
- Agora terei melhor sorte!
Lars chamou a mendiga. Pegou a velha e tentou jogá-la no forno. A pobre mulher gritava desesperada, mas o ferreiro a acalmava:
- Calma! Calma! Você é tão velha que não sabe o que é bom! Vai agora se transformar numa linda donzela!
Lars conseguiu jogar a mulher no forno. Mas quando tirou a pobre de lá o resultado não foi o esperado. A mendiga velha virou um carvão esturricado. Lars ficou desesperado. Até que Jesus apareceu junto com São Pedro e disse:
- Isso não está bem feito, ferreiro!
- Ah! - disse Lars – fui enganado pelo diabo! O danado me disse que eu seria o maior em meu serviço por sete anos se eu entregasse minha alma para ele!
- Você fez acordo com o diabo? - quis saber Jesus.
- Fiz! Mas estou arrependido!
- E se eu der pra você três desejos? - perguntou o Senhor – o que você pediria?
- Se o senhor me der - disse o ferreiro – eu posso escolher?
- Então escolha! - respondeu o Senhor.
E aí São Pedro foi no ouvido de Lars e sussurrou:
- Pede o céu!
Mas o homem não ligou muito e fez os seus pedidos:
- Bem... em primeiro lugar... gostaria que quem subir naquela macieira, que fica atrás da minha casa, só consiga descer se eu mandar!
São Pedro ficou espantado e insistiu com Lars:
- O que é isso? Pede o céu, ferreiro!
Mas o homem não ligou e fez mais um pedido:
- Meu segundo desejo é assim: eu quero que qualquer um que sente na minha poltrona, fique lá até eu mandar levantar!
São Pedro ficou mais espantado e disse mais enérgico:
- Pede o céu, criatura!
Mas o ferreiro não ligou e fez o terceiro pedido:
- E agora o meu último pedido: eu desejo que qualquer um que entrar na minha bolsinha de moedas, só saia se eu mandar!
Jesus achou muita graça nos pedidos e deu os desejos para o ferreiro. Mas São Pedro não gostou daquela história:
- Você é um homem mau, ferreiro Lars! Devia ter pedido o céu!
Jesus e São Pedro despediram-se de Lars e continuaram seu caminho.
O tempo passou. Rápido como um pé de vento.
Logo o diabo apareceu na porta do ferreiro para cobrar o acordo.
- Você está pronto? - perguntou o coisa ruim.
- Ah... - respondeu Lars – Os sete anos já passaram?
- Já, sim senhor! Está na hora de levar sua alma!
E o ferreiro disse:
- Está certo! Vou com você, mas antes tenho que terminar de bater esses pregos. Mas é coisa rápida. Não demora nada! Para esperar, você pode subir naquela árvore ali. Aproveita e coma uma maçã! Essas são as melhores dessa região!
- Está bem! Mas não demore!
O diabo falou assim e subiu na macieira. O ferreiro terminou de fazer seu serviço e disse para o malvado:
- Sabe, coisa ruim, acho que não vou agora com você! Estou querendo ficar mais um tempo por aqui! Tenho ainda muita coisa pra fazer!
O diabo deu uma gargalhada e já ia pulando sobre Lars, quando percebeu que estava preso. Esperneou e berrou tentando sair, mas não conseguia. E Lars falou assim:
- Ih... Acho que você está muito nervoso! Vou deixar você aí por um tempo para se acalmar!
E o ferreiro deixou o diabo preso por um mês inteiro. No final desse tempo, o malvado estava faminto. Já tinha comido todas as maçãs que podia alcançar. Além disso estava rouco. Gritou tanto pedindo ajuda, que sua voz era só um fiapo. No fim desse mês o ferreiro foi até o diabo.
- Coisa ruim, acho que vou libertar você! – disse Lars – Mas só liberto se você prometer que vai me deixar ficar por aqui por mais dez anos! Promete?
O diabo não teve outro jeito se não prometer. O ferreiro soltou o malvado que saiu cuspindo fogo de raiva.
O tempo passou. Rápido como um raio.
Logo passaram os dez anos e o diabo foi bater de novo na casa de Lars. O homem quando viu o canhoto foi logo dizendo:
- Ah... Você por aqui de novo! Que satisfação!
Mas o diabo não estava para brincadeiras:
- O tempo passou e eu vim aqui pra levar você!
- Nem senti o tempo passar! – disse Lars – Mas vou com você! Só quero me despedir de minha jovem mãezinha! Pode ser?
- Pode! - respondeu o diabo – Mas não demore muito!
- Se quiser pode descansar em cima da árvore!
- De jeito nenhum! - respondeu o canhoto.
E o Lars apontou para a poltrona e sugeriu:
- Então descanse na minha poltrona que é confortável demais!
O diabo sentou na poltrona. O ferreiro fez menção de sair, mas logo voltou dizendo:
- Pensando melhor... acho que não vou agora com você! Tenho ainda muito o que fazer aqui!
O diabo deu uma gargalhada e já ia pulando em cima do ferreiro, quando percebeu que estava novamente preso. O malvado esperneou e gritou tentando sair, mas não conseguia. E Lars falou:
- Xiiii... ficou preso de novo, coisa ruim? Mas vou provar para você que sou uma boa pessoa. Posso deixá-lo aí sentado, por dois meses seguidos, se você quiser. Ou posso libertá-lo, se você prometer que vai me deixar por aqui por mais vinte anos! Aceita?
Claro que o demônio aceitou.
E o tempo passou mais uma vez. Rápido, como um piscar de olhos, passaram os vinte anos.
E o diabo surgiu de novo na casa do ferreiro e foi logo falando:
- Nem adianta que eu não vou descansar! Não quero sentar! Não quero subir! Quero ir embora! Vamos embora agora que acabou o seu tempo por aqui!
Lars olhou espantado para o malvado e disse:
- Canhoto, você por aqui? Já passou o meu tempo?
- Já! – respondeu o demônio – E vamos embora agora!
- Claro que vamos! - disse o ferreiro – Mas antes eu queria que você me tirasse uma dúvida. Pode ser?
O diabo estranhou, mas ficou curioso e perguntou:
- O que é que você quer saber?
E o homem explicou:
- Eu tenho um compadre que disse que você, capeta, pode ficar do tamanho que quiser! Pode ficar bem pequeno e entrar até... numa bolsinha de moedas! Isso é verdade?
- Claro que é! - respondeu o malvado.
Mas Lars deu uma risadinha e duvidou:
- Eu não acredito! Ninguém pode fazer isso!
O diabo ficou furioso e gritou:
- É claro que eu posso! Eu posso tudo!
- Isso você não pode! Eu não acredito! Não acredito mesmo! - duvidou novamente o ferreiro.
- Como ousa duvidar de mim? Se eu estou dizendo que posso... é porque eu posso! - esbravejou o canhoto.
E Lars falou:
- Então, prove! Quero ver! Só acredito vendo! Entre aqui nessa bolsinha...
Lars mostrou a sua bolsinha de moedas. O diabo ficou bem pequeno e entrou naquela bolsa miúda. Então o ferreiro falou:
- É verdade! Você pode ficar pequeno e entrar numa bolsinha de moedas! Agora... será que consegue sair?
O diabo deu uma gargalhada e falou:
- É claro! Eu faço o que eu quero!
E o coisa ruim tentou sair, mas não conseguiu. Percebendo que tinha sido novamente enganado o malvado ficou desesperado e gritou:
- Deixa eu sair daqui! Quero sair daqui! Você pode viver quantos anos quiser!
E o ferreiro deu um sorriso.
- Mas de onde vem tanta boa vontade, coisa ruim? Estou até espantado! Já que está tão generoso... Eu acho que posso pedir: quero viver para sempre!
O diabo, dentro da bolsinha, esbravejou muito:
- Para sempre é muito tempo! Você não pode viver para sempre!
Tranquilo como estava, Lars falou:
- O senhor é que sabe, coisa ruim! Vou deixá-lo aí pensando no assunto! E para ajudar, vou colocar a bolsinha no forno para aquecer suas ideias!
O homem pegou a bolsinha de moedas e colocou no forno que estava em brasas. O diabo, lá dentro, gritava como um louco:
- Você não pode fazer isso! Eu vou assar que nem um bolo!
A coisa foi esquentando. O ferreiro sentou do lado do forno e ficou esperando. Quase sem conseguir respirar o canhoto gritou:
- Está bem! Está bem! Você vai viver para sempre! Prometo!
Lars tirou a bolsinha do forno e deixou esfriar. Depois libertou o diabo que foi embora xingando muito.
O tempo passou, mas dessa vez passou lento.
A mãe do ferreiro deixou de ser jovem e morreu. Passaram mais duzentos anos e o ferreiro cansou. Não queria mais viver e começou uma viagem para encontrar o céu. Andou muito. Uma jornada sem fim. Até que chegou numa estrada com uma bifurcação. Ficou em dúvida que caminho devia tomar. Passou um camponês e Lars perguntou:
- Boa tarde, meu bom homem! Esses caminhos levam para onde?
E o camponês respondeu:
- O da direita leva para o céu! Para a morada da felicidade! Para a casa dos anjos e de Jesus! E o da esquerda leva para o inferno! Para casa do coisa ruim! Do cão!
O ferreiro agradeceu ao homem e tomou o caminho da direita. Estava com saudades de Jesus e queria encontrar com ele. Chegou na mansão e encontrou com São Pedro na porta. Lars disse que queria entrar, mas o chaveiro celeste estava irritado:
- Lembra quando ganhou aqueles desejos e eu disse que você devia pedir o céu? O que foi que você fez? Pediu o céu? Não! Pediu aquele monte de bobagens! Aqui você não entra!
Obediente, o ferreiro foi para a casa do cão. Mas quando ele estava chegando... o diabo o viu da janela. Mandou os diabinhos trancarem as portas e as janelas da casa. O canhoto não queria um homem esperto daqueles no lugar. O Lars bateu na porta e ninguém abriu.
E o coitado do ferreiro começou a sua peregrinação: ia para o céu e São Pedro não deixava entrar. Ia para o inferno e ninguém abria a porta.
E dizem que ele está assim até hoje: do céu para o inferno e do inferno para o céu! Do céu para o inferno e do inferno para o céu!
E acabou a história!
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
O GRANDE CAVALO
Era uma vez um casal muito rico que tinha doze filhos. O mais jovem chamava-se Ivor e, quando ficou crescido, quis sair pelo mundo para fazer fortuna. Os pais ficaram preocupados, mas ao mesmo tempo sentiram orgulho de o filho querer tentar a própria sorte.
Ele arrumou suas coisas e seguiu viagem. Andou muito, até que chegou no castelo do Rei. Ivor pediu um emprego e conseguiu.
A filha desse Rei tinha sido levada para as montanhas por um monstro. O Monarca não tinha outros filhos, por isso, ele e seu povo viviam cheios de tristeza. O Rei até prometeu a mão de sua filha e metade de seu reino para quem conseguisse libertá-la. Muita gente tentou, mas ninguém conseguiu.
Depois que Ivor trabalhou no palácio por um ano, sentiu saudades dos seus pais e foi fazer uma visita. Quando chegou lá, teve uma grande tristeza: o pai e a mãe tinham morrido. Seus irmãos dividiram entre eles a herança.
- O quê? Eu não receberei nada da minha herança? - O rapaz perguntou.
E o mais velho dos irmãos respondeu:
- Não sabíamos onde você estava! Nem se estava vivo ou morto! Você ficou fora por muito tempo! Mas, mesmo assim, deixamos para você doze éguas que estão no alto daquela colina! Elas são suas! Pode pegá-las!
Ivor ficou satisfeito e partiu para tal colina. Quando ele chegou lá, encontrou os animais no pasto. Ele ficou mais feliz, porque uma das éguas estava dando a luz a um potro. Mas o bichinho nasceu magrinho e fraco. O rapaz só achou estranho o fato de não ter nenhum cavalo por ali. Como aquele potro teria nascido? O jovem começou a cuidar do potro.
- Vou cuidar de você porque é um bom sujeito! - disse Ivor.
E aconteceu uma coisa muito estranha. O potro respondeu:
- Sim, mas ainda estou muito fraco!
O rapaz ficou espantado, mas o potro o acalmou:
- Não se assuste! Serei de grande ajuda para você! Vou tomar o leite de minhas mães para ficar forte e grande!
O rapaz se acalmou e perguntou:
- Como assim “mães”? Todas são suas mães?
- Sim! - respondeu o potro – Construa uma cerca, em volta dessa terra, para nos proteger! Depois, volte daqui há um e verá como estarei grande e bonito!
O jovem assim fez. Construiu uma grande cerca e foi embora.
No ano seguinte, quando Ivor voltou, encontrou as éguas pastando. No meio delas um cavalo enorme, lindo, com o pelo brilhante e malhado. O rapaz se aproximou do grande animal e disse:
- Nossa! Você está enorme! Vou chamar você de Mox Malhado!
E o cavalo falou:
- Você pode montar em mim que eu o levarei ao palácio do Rei!
Mas o cavalo era tão grande, que o rapaz não conseguia montar. Ele tentou subir numa das éguas para alcançar o Mox Malhado. Mesmo assim não conseguiu. O cavalo então, baixou a cabeça e o rapaz subiu nele pelo pescoço.
- Mox Malhado! - disse Ivor – Não existe no reino um cavalo do seu tamanho! Vamos para o castelo do Rei!
- Sim! Vamos! Mas antes você deve libertar minhas mães! Elas devem correr livres!
- Então vamos destruir essa cerca! - respondeu Ivor.
Com muita facilidade, Mox Malhado investiu sobre aquilo destruindo a cerca completamente. As éguas correram livres e o cavalo falou:
- E agora vamos ao castelo de seu Rei! Mas quando chegarmos lá você deve pedir ao Monarca uma boa forragem para me alimentar!
Ivor prometeu não esquecer.
Quando eles chegaram no castelo todos ficaram espantados. Era o maior cavalo do mundo. O Rei ficou encantado.
- Santo Deus! - disse ele - Nunca na minha vida eu tinha visto um animal desse tamanho!
O rapaz perguntou se ele poderia ficar no castelo do Rei. O Monarca ficou muito contente em ter aquele cavalo enorme nos seus domínios. E Ivor pediu:
- Precisamos de uma boa forragem para o meu cavalo!
E o Rei ordenou que dessem, todo dia, a melhor alimentação para aquele cavalo. Mox Malhado passou a receber, todo dia, feno doce e aveia.
Os outros cavaleiros ficaram com ciúmes. Por causa do grande tamanho de Malhado, todos os outros cavalos tiveram que sair do estábulo. Com muita inveja, os cavaleiros inventaram uma história que logo chegou aos ouvidos do Rei. Disseram que Ivor vivia declarando que poderia salvar a filha do Rei do monstro que a levara.
O Monarca convocou o rapaz e perguntou se era verdade o que diziam dele. Caso fosse verdade, a velha promessa estava de pé: ele poderia ter a mão da Princesa e metade do reino. Mas, se ele falhasse, seria condenado à morte. E Ivor respondeu:
- Nunca disse ser capaz de realizar tal tarefa! Mas como essa história já corre por todo o reino, vou salvar a Princesa!
O jovem desceu até o estábulo para pedir conselhos ao seu cavalo.
- Eu aposto que nós dois podemos salvar a Princesa! - disse Mox Malhado - Primeiro preciso de boas ferraduras. Peça ao Rei dez quilos de ferro e doze quilos de aço para me calçar!
O rapaz fez o pedido ao Rei e foi atendido imediatamente. Os melhores ferreiros do reino foram convocados para realizar a tarefa. E as ferraduras ficaram tão grandes e poderosas que, quando o rapaz saiu do castelo montado em seu cavalo, uma nuvem de poeira levantou-se atrás dele.
Mais tarde, ele chegou na montanha onde a Princesa estava prisioneira. Foi difícil subir as paredes íngremes da rocha, mas, com muito esforço, eles conseguiram. Quando eles chegaram lá no alto da montanha, Ivor viu a filha do Rei presa em uma grande gruta na montanha. Ela estava sentada lá, com uma coroa de ouro na cabeça. O jovem e seu cavalo galoparam com força em direção a Princesa. Ao chegar na gruta, o jovem agarrou a jovem e a jogou na sua garupa. O monstro apareceu e investiu sobre eles. E o Malhado gritou:
- Segure-se bem, meu amo!
Ivor segurou com força e a Princesa agarrou-se também ao seu salvador. O Mox Malhado empinou e levantou as patas no ar. Depois bateu com força no chão. Um grande buraco apareceu no chão, o monstro caiu naquilo e desapareceu para sempre.
Ivor levou a Princesa para o Rei. O Monarca ficou feliz em receber sua filha de volta, mas começou a mudar as coisas. Não queria que sua filha casasse com um simples cavaleiro. O Rei fez uma cara estranha e declarou:
- Graças a você minha filha está livre! Mas pensei melhor e quero que você realize outras tarefas antes de se casar com a Princesa!
O jovem ficou chateado. O combinado não era esse. E ele disse ao Rei:
- O acordo não era esse, mas aceito realizar novas tarefas! O que, meu Rei, deseja?
E o Monarca respondeu:
- O meu castelo sofre muito por que aqui quase não bate sol! Aquela montanha impede a passagem dos raios solares! Quero que o sol brilhe em meu castelo!
- Isso não fazia parte do nosso negócio - respondeu Ivor - Mas eu vou fazer, para que a Princesa seja minha!
O jovem foi ao estábulo e pediu conselhos ao Mox Malhado.
- Vamos fazer! - disse o cavalo.
O jovem montou em Malhado e os dois seguiram para tal montanha. Ao chegar lá o cavalo falou:
- Segure-se bem, meu amo!
O rapaz segurou-se com força. O Malhado começou a dar pinotes, batendo as poderosas patas com força nas pedras. Dava saltos fantásticos destruindo a montanha. Depois de um tempo, aquela barreira foi desaparecendo e o sol voltou a brilhar no castelo.
Quando Ivor desceu novamente para o castelo do Rei, ele perguntou se o sol já estava iluminando tudo. O Monarca estava satisfeito, mas fez um novo pedido:
- A tarefa foi realizada, mas tenho outra para você! Minha filha vai casar com você, mas deve ter um cavalo tão grande como o seu para o casamento!
O rapaz estava chateado. A paixão pela Princesa já tomava conta do seu coração, mas aquelas tarefas não estavam no acordo. O Rei não queria saber. E ainda disse mais:
- É assim que será! E se você não conseguir o cavalo vai perder a vida!
Ivor desceu ao estábulo e contou para o Mox Malhado tudo o que o Rei disse. Mas o cavalo o tranquilizou:
- Vamos resolver! Mas não será fácil! Você deve pedir ao Rei doze sacos de milho. Temos que levar também doze bois abatidos e um barril com doze toneladas de alcatrão! Entendeu?
O jovem foi ao Monarca e fez os pedidos. O Rei achou aqueles pedidos estranhos, mas deu tudo o que foi solicitado. Mais tarde, o rapaz montou em Malhado e partiu. Depois de muito viajar o cavalo perguntou:
- Você está ouvindo alguma coisa?
- Sim, um assobio muito terrível! - respondeu o rapaz – O que é isso?
- Isso são cucos selvagens da floresta. Eles vão tentar impedir a nossa viagem! Faça buracos nos sacos e deixe o milho cair! Jogue tudo na estrada!
Ivor assim fez. Os cucos selvagens apareceram voando. Eram tantos que o céu ficou escuro. Mas quando as aves viram o milho pela estrada, esqueceram de tudo e ficaram mordiscando os grãos.
O Malhado e seu cavaleiro puderam seguir viagem. Andaram bastante até que o cavalo ouviu de novo um barulho.
- Está escutando isso? - perguntou Mox Malhado.
- Sim! - respondeu o rapaz – Um barulho terrível!
- São os duendes da floresta! Eles foram enviados para nos parar! - disse o cavalo – Coragem! Jogue os bois na estrada!
O rapaz jogou fora as carcaças dos bois, e, em seguida, apareceram os duendes da floresta. Eles pareciam palhaços macabros com uma cara branca, a boca vermelha e cabeleiras coloridas. Os duendes caíram em cima das carcaças e começaram a brigar por pedaços de carne. O jovem e seu cavalo estavam livres para continuar seu caminho. Viajaram muito, até que Mox Malhado relinchou alto.
- Você ouve um potro relinchar? - perguntou.
- Sim! - respondeu Ivor - Mas está longe de nós!
Eles seguiram pela estrada. Até que Mox Malhado relinchou novamente.
- Você ouve um cavalo adulto desta vez? - perguntou ao amo.
- Sim! - respondeu o rapaz.
Então, eles viajaram ainda mais. O Malhado relinchou pela terceira vez. E o jovem escutou um outro relinchar que se aproximava.
- Agora ela está aqui! - disse o Malhado.
Do nada surgiu uma égua enorme que veio soltando fogo pelas narinas. E Mox Malhado gritou:
- Meu amo, desmonte e jogue o alcatrão no chão!
O rapaz assim fez e o alcatrão pegou fogo em um momento. Malhado e a égua começaram uma luta terrível. Parecia que aquilo não ia ter fim para nenhum dos dois. Finalmente, a égua teve que ceder a força de Mox Malhado. A fêmea foi para baixo de uma árvore e deitou-se.
- Agora, meu amo, pode colocar uma corda no pescoço da égua que ela está dócil como um anjo! - disse Mox Malhado.
O rapaz jogou uma corda, mas não alcançou. A égua era tão grande quanto o seu cavalo. A fêmea abaixou a cabeça e o jovem pode amarrar a corda em seu pescoço. Essa égua era malhada como o seu cavalo. A única diferença dos dois é que o Malhado era um pouco maior e mais forte. O rapaz montou no seu cavalo e os dois voltaram para o reino puxando a égua. Quando chegaram lá, o Rei estava no pátio e Ivor anunciou:
- Aqui está, senhor meu Rei, a égua para a Princesa! É praticamente igual ao meu cavalo!
Realmente era impressionante a semelhança. Mas o Rei ainda disse:
- Você está quase conseguindo o seu objetivo! Tenho ainda uma última tarefa: sua noiva vai se esconder duas vezes. E você terá que encontrá-la. Caso não consiga, perderá o direito de casar. Depois, você é que deve se esconder. E se a Princesa não encontrar você, aí sim, terá direito a casar com a minha filha!
E assim aconteceu: a linda Princesa se escondeu em primeiro lugar. Ela transformou-se em um pato de ouro e foi nadar em um lago fora do castelo. Ivor foi ao estábulo e perguntou ao Malhado o que fazer.
- Bem... - respondeu o cavalo – pegue a sua arma e vá até o lago que fica fora do castelo. Se ver um pato de ouro, aponte para ele com intenção de atirar. Aposto que a Princesa vai aparecer bem depressa!
O rapaz pegou sua arma e correu para o lago. Viu o pato de ouro e apontou para matar.
- Oh, não! Não atire, caro amigo! Sou eu! - disse o pato já se transformando na filha do Rei.
A jovem então correu dali e foi para cozinha real. Transformou-se num pão bem fresquinho e ficou num cesto junto com outras guloseimas. Ivor foi novamente ao estábulo pedir ajuda ao cavalo.
- Vá até a cozinha e pegue uma faca de pão. No cesto de pães você vai escolher o mais fresquinho. Finja que vai cortar esse pão e aí você vai encontrar a sua Princesa! - disse o Malhado.
Então, o rapaz foi até a cozinha e começou a afiar a maior faca de pão que ele encontrou. No cesto, ele pegou o pão mais fresquinho e já ia começar a cortar quando ouviu o grito:
- Não, meu caro amigo, não corte que sou eu! - disse a filha do Rei já voltando a sua verdadeira forma.
Agora era a vez do rapaz ir se esconder. Com a ajuda de Mox Malhado, ele se transformou em um grão de feijão e se escondeu na narina esquerda do seu amigo. A Princesa bem que procurou. Chegou até a pensar em procurar perto do Malhado, mas o cavalo começou a dar coices e ela ficou com medo. Depois de um tempo a Princesa desistiu.
- Bem - disse ela - eu sou incapaz de encontrar você! Apareça, por favor.
No mesmo instante o rapaz apareceu.
Mas ele precisava se esconder mais uma vez. E novamente o seu cavalo o ajudou. Ivor se transformou em um torrão de terra e ficou entre os cascos do seu Malhado. A bela Princesa não tinha coragem de se aproximar daquele cavalo imenso. A jovem ainda procurou por um tempo, até que desistiu:
- Bem, não consigo achar você, meu salvador! Não sei onde você está!
O rapaz apareceu e a bela filha do Rei, que estava completamente apaixonada, disse:
- Agora você é meu!
E o rapaz pediu ao Monarca:
- Agora, o senhor meu Rei, permite que eu case com sua filha?
O Monarca concordou. No dia do casamento, Ivor entrou na igreja com o seu Mox Malhado e a filha do Rei com a égua.
Eles casaram e viveram felizes por muito e muitos anos.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
TRÊS CABRAS
Era uma vez, três cabras que buscavam um lugar para pastar. Estavam procurando um bom lugar quando viram de longe um morro com uma pastagem verde e farta. No caminho para o lugar tinha uma ponte de madeira. Um duende muito feio, com olhos grandes e redondos do tamanho de um pires e um nariz pontudo, morava embaixo dessa ponte.
A primeira cabra que chegou na ponte foi a mais nova. Começou a atravessar para o outro lado batendo os cacos nas madeiras da ponte. E esse bater fazia um barulhinho assim:
“Trip, trap!”
Embaixo o duende não gostou:
- Quem é que está passando na minha ponte?
O duende disse isso e pulou na frente da cabra. E a jovem cabra respondeu:
- Sou eu, a cabra mais nova do rebanho! Estou indo até o monte para pastar e ficar bem gordinha!
E o duende rugiu ameaçador:
- Não vai porque eu vou comer você!
- Oh, não! Não me coma! - disse a cabra - Eu sou muito pequena e magrinha! Espere um pouco que minha irmã do meio está vindo aí! Ela é muito maior!
O duende ficou com água na boca imaginando a outra cabra.
- Está bem! Você é muito magrinha mesmo! Vou esperar sua irmã! Passa daqui!
A jovem cabra passou correndo. E o duende se escondeu. Não demorou muito apareceu a cabra do meio. Ela começou a atravessar a ponte batendo os cascos na madeira. E o barulho que fazia era assim:
“Trip, trap! Trip, trap! Trip, trap!”
E o duende gritou do esconderijo:
- Quem é que está passando na minha ponte?
E a cabra respondeu:
- Sou eu, a cabra do meio do meu rebanho! Estou indo até o monte para comer e engordar bastante!
E o duende rugiu e pulou na frente da cabra:
- Não vai porque eu vou comer você!
- Oh, não! - disse a cabra do meio - Não faça isso! Eu sou muito magrinha! Não vou matar sua fome! Espere um pouco até que minha irmã mais velha passe por aqui! Ela é muito maior do que eu!
O duende ficou com água na boca imaginando a cabra mais velha.
- Está bem! Você é muito magrinha mesmo! Vai embora daqui!
A cabra do meio saiu correndo. E o duende se escondeu. Não demorou muito, a cabra mais velha começou a atravessar a ponte. Ela era muito grande, pesada e seus cascos batiam na madeira fazendo assim:
"Trip, trap! Trip, trap! Trip, trap! Trip, trap! Trip, trap!”
O duende gritou do esconderijo:
- Quem é que está passando na minha ponte com esse peso tão grande?
E a cabra mais velha respondeu com uma voz grossa:
- Sou eu, a cabra mais velha do meu rebanho! Estou indo até o monte para comer e engordar bastante!
E o duende pulou na frente da grande cabra e rugiu:
- Não vai porque eu vou comer você!
E a cabra deu uma risada:
- Isso é que nós vamos ver! Não tenho medo de você!
O duende foi pra cima da cabra. Mas ela era grande e deu uma chifrada no malvado que o atirou longe. O duende quis fugir, mas a cabra foi rápida e deu mais duas chifradas no narigudo. Foi tamanha a força das pancadas que o danado saiu correndo como um foguete. Nunca mais ninguém ouviu falar desse duende. A cabra mais velha subiu no monte e encontrou suas irmãs. Ficaram as três vivendo ali tranquilas, comendo e engordando.
E acabou a história.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA
O MENINO QUE FOI AO VENTO NORTE
Era uma vez, num lugar distante, uma velha viúva que tinha um filho. O menino chamava-se Pedro. A mulher estava muito doente e o rapazinho tinha que cuidar da mãe. Um dia, Pedro foi na despensa, que ficava fora da casa, buscar comida para cozinhar. Quando ele saiu da despensa e estava indo para cozinha, veio o Vento Norte soprando com força. Soprou tanto que levou todos os alimentos que o menino carregava. Pedro ficou chateado. Voltou a despensa para pegar outros alimentos e, quando ele saiu, o Vento Norte veio novamente e levou tudo o que ele tinha apanhado. Dessa vez, o menino ficou muito irritado e resolveu procurar o Vento Norte para pedir os alimentos de volta.
O Pedro foi, mas o caminho era longo e ele andou que andou. Até que finalmente, depois de um dia inteiro de caminhada, chegou na casa do Vento Norte e falou:
- Bom dia! Obrigado por nos visitar ontem!
E o Vento respondeu com uma voz rouca e áspera:
- Bom dia! E obrigado por ter vindo me ver! O que você quer?
- Eu só queria pedir que o senhor devolvesse a comida que levou de mim ontem! Moro só com minha mãe e não temos muito dinheiro! E esses alimentos, que o senhor levou, vão fazer falta!
E o Vento Forte falou:
- Ih, meu filho, não tenho mais aquela comida! Já comi tudo! Mas pra você não ficar triste vou dar uma toalha mágica! É só você dizer: “Toalha, sirva todo o tipo de pratos!” Depois é só estender o pano. Vai aparecer todo tipo de comida gostosa! Mas não conte isso para ninguém!
- Nem para minha mãe? - perguntou o Pedro.
- Só para sua mãe! E só use o poder da toalha na sua casa! Entendeu?
O Vento disse isso e deu para o garoto a toalha que era ricamente decorada. O menino ficou satisfeito. Pegou aquele pano mágico e começou a voltar pra casa. Mas o caminho era longo e ele estava cansado. Resolveu descansar numa pousada no caminho. Chegou no lugar e pediu um quarto. O dono da pousada ficou encantado com aquela toalha que o rapaz levava e quis saber onde ele tinha conseguido aquela preciosidade. E o Pedro falou:
- Foi o Vento Norte que me deu!
O rapaz foi para o quarto, mas o dono da pousada foi atrás e ficou espiando pelo buraco da fechadura. Dentro do quarto, o menino falou:
- Estou com tanta fome e não tem ninguém aqui! Acho que não tem problema de usar o poder da toalha!
Ele pegou o pano, chegou perto de uma mesa que estava no canto e disse:
- Toalha, sirva todo o tipo de pratos!
E estendeu o pano. O Pedro quase não terminou de falar e apareceu muita comida e bebida em cima da mesa. O menino comeu do bom e do melhor. Depois foi dormir. Na calada da noite, o dono da pousada entrou no quarto, pegou a toalha do rapaz, e colocou outra igual em seu lugar. Assim, quando o menino acordou, pegou a toalha e foi embora. Chegou em casa e falou com a mãe:
- Mãe, eu fui na casa do Vento Norte! Ele me deu de presente uma toalha mágica! É só a gente falar: “Toalha, sirva todo o tipo de pratos!” que aparece um monte de comida!
E a mãe quis saber:
- Tudo muito certo, meu querido! Tudo muito bom! Mas é ver para crer! Não posso acreditar se você não mostrar!
Então o rapaz falou:
- Toalha, sirva todo o tipo de pratos!
E estendeu o pano numa mesa. Mas não apareceu nem um pão seco. E a mãe disse:
- Meu filho, eu aqui doente e você com essa bobagem de toalha! Assim não dá!
O rapaz ficou chateado e resolver voltar para a casa do Vento Norte. Andou bastante até chegar lá.
- Boa tarde! - disse Pedro.
- Boa tarde! - respondeu o Vento Norte.
E o menino reclamou:
- O senhor me enganou! Aquela toalha só funcionou uma vez! Agora ela não vale mais nada!
- Estranho! - disse o Vento Norte – Mas vou dar outro presente! Um carneiro mágico! Basta você dizer: “Carneiro, quero ganhar dinheiro!” que o bicho vai cuspir muito dinheiro! Mas não conte isso para ninguém!
- Nem para minha mãe? - perguntou o menino.
- Só para sua mãe! E só use o poder do carneiro na sua casa! Entendeu?
O Vento disse isso e deu para o garoto um carneiro grande. O menino ficou satisfeito. Pegou aquele bicho e começou a voltar pra casa. Mas o caminho era longo e ele estava cansado. Resolveu descansar de novo na pousada. Chegou no lugar e pediu um quarto. O dono da pousada ficou curioso com aquele carneiro tão grande. Achou que podia ser mais um presente mágico e perguntou onde o garoto tinha conseguido aquele bicho. E o Pedro falou:
- Foi o Vento Norte que me deu!
O rapaz foi para o quarto, mas o dono da pousada foi atrás e ficou espiando pelo buraco da fechadura. Dentro do quarto, o menino falou:
- Estou com tanta fome e sem dinheiro! Não tem ninguém aqui! Acho que não tem problema de usar o poder do carneiro!
E o menino falou para o bicho:
- Carneiro, quero ganhar dinheiro!
O Pedro quase não terminou de falar e o bicho cuspiu um monte de dinheiro. O garoto abriu a porta e quase pegou o dono da pousada espiando pela fechadura. O homem disfarçou e perguntou se o menino queria alguma coisa.
- Quero uma ceia bem farta – disse o rapazinho – E aqui tem o dinheiro para pagar a comida e a pousada! Pode ser?
- É num instante! - respondeu o homem.
O menino entrou no quarto. Não demorou muito e o dono da pousada apareceu com uma bandeja cheia de comidas gostosas. O garoto comeu do bom e do melhor e depois foi dormir. Na calada da noite, o dono da pousada entrou no quarto e trocou o carneiro por outro igual.
Assim, quando o menino acordou, pegou o carneiro e foi embora. Chegou em casa e falou para a mãe:
- Mãe, eu fui de novo na casa do Vento Norte! Ele me deu esse carneiro! É só a gente falar: “Carneiro, quero ganhar dinheiro!” que aparece uma fortuna!
E a velha mãe quis saber:
- Tudo muito certo, meu querido! Tudo muito bom! Mas é ver para crer! Não posso acreditar se você não mostrar!
Então o rapaz falou para o carneiro:
- Carneiro, quero ganhar dinheiro!
Mas não apareceu nem um tostão furado. E a mãe disse:
- Meu filho, eu aqui doente e você com essa bobagem de carneiro! Assim não dá!
O Pedro ficou chateado e resolver ir mais uma vez na casa do Vento Norte. Andou bastante até chegar lá.
- Boa noite! - disse o menino.
- Boa noite! - respondeu o Vento Norte.
E o rapaz reclamou:
- O senhor me enganou de novo! Aquele carneiro só funcionou uma vez! Agora ele não vale mais nada!
- Estranho! - disse o Vento Norte – Você falou dos presentes com mais alguém?
- Não! Só com a minha mãe! - respondeu o rapaz.
E o Vento fez mais uma pergunta:
- E você usou o poder do carneiro só na sua casa?
- Não! Usei dentro do quarto da pousada, mas ninguém viu! Tenho certeza - respondeu o menino.
- E com a toalha foi a mesma coisa? - quis saber o Vento Norte.
- Foi! - respondeu o rapazinho - Ela só funcionou no quarto da pousada! Mas tenho certeza absoluta que ninguém viu!
O Vento Norte pensou um pouco e disse:
- Já sei o que está acontecendo! Vou ajudar você dando mais um presente! Um bastão de madeira! Ele é mágico! Basta você dizer: “Bastão, faça o seu serviço!” que ele vai bater em quem você quiser. Para o bastão parar é só falar: “Bastão, acabou o serviço!”. Entendeu?
O menino entendeu, mas quis saber mais.
- E como é que isso vai me ajudar?
E o Vento respondeu:
- Você vai dormir na pousada, mas não use os poderes do bastão antes de se deitar! Diga ao dono da pousada que esse presente tem poderes maravilhosos! Depois deite na sua cama e fique com um olho aberto e outro fechado! Entendeu?
O Vento disse isso e deu para o garoto o bastão. O menino foi para a pousada. Chegou no lugar e pediu um quarto. O dono da pousada ficou curioso com aquele bastão e o rapaz falou como o Vento ensinou:
- Esse presente tem poderes maravilhosos!
Disse como ensinado e foi para o quarto, mas o dono da pousada foi atrás e ficou espiando pelo buraco da fechadura. O menino deixou o bastão num canto e foi dormir. Mas ficou com um olho aberto e outro fechado. Tarde da noite, o ambicioso dono da pousada entrou no quarto e já ia pegar o objeto quando o menino pulou da cama gritando:
- Bastão, faça o seu serviço!
Foi ele dizer isso que o objeto mágico começou a trabalhar. Bateu com força no dono da pousada. O homem ficou desesperado:
- Socorro! Acuda! Eu devolvo os seus presentes mágicos!
- Então você roubou os meus presentes? - perguntou o menino.
- Sim! Mas eu devolvo tudo!
E o Pedro falou:
- Bastão, acabou o serviço!
O objeto parou de bater e o dono da pousada, todo arrebentado, devolveu os presentes.
O Pedro pegou suas coisas e voltou para casa. Mostrou para a mãe os presentes verdadeiros. A mulher ficou satisfeita e eles viveram felizes por muitos e muitos anos.
ADAPTAÇÃO DE AUGUSTO PESSÔA