PEDRO MALASARTES
Pedro Malasartes é um dos personagens mais encontrados na cultura popular do Brasil. Em todas as regiões do país encontramos relatos sobre as aventuras desse caipira. Malasartes sempre é apresentado com todos os clichês do típico homem do povo: é magro, amarelo, aparentemente fraco, feio. Mas Pedro Malasartes tem uma característica especial: é esperto. E vive de suas espertezas e artimanhas.
Diferente de outros heróis da cultura popular, que procuram vencer os poderosos e buscam uma felicidade (geralmente ligada ao casamento ou a fortuna), Malasartes é um anti-herói. Ele não busca a felicidade e a fortuna como fim para sua existência. Malasartes busca o prazer. Ele derrota os poderosos com suas artimanhas não para tomar-lhes o lugar ou a fortuna, mas para conseguir dinheiro para o seu prazer. Ao conseguir esse dinheiro, ele o gasta todo até ficar sem nenhum e vive outra aventura para conseguir mais dinheiro.
Malasartes pode ser comparado ao Scapino ou ao Arlequim da Comedia Del’Arte. É encontrado também em outros países: Na Ásia é conhecido como Kuong-Alev. Na África recebe o nome, em certas regiões, de Foumtinndouha. Na Europa do Norte, do centro e do leste, é o Eulenspiegel. Na Itália é Bertoldinho. Na Espanha e na América Espanhola tem o curioso nome de Pedro Urdemales.
PERSONAGENS:
COMPADRE JOÃO (Fazendeiro, Malasartes II, Dono da Birosca, Anjo).
COMPADRE JOSÉ (Malasartes I, Moço Doutor, Compadre II, Anjo).
COMPADRE MATEUS (Fazendeiro Rico, Compadre I, Malasartes IV).
SIA MADALENA (Fazendeira, Malasartes III, Anjo, Voz de São Pedro)
CENA: o palco começa vazio.Um galo canta ao longe. A iluminação cresce como se o dia estivesse amanhecendo. Entram os quatro atores cantando. Cada um vem de um lado do palco. São viajantes que trazem malas, trouxas e baús. Os objetos são colocados no centro do palco e começam, ainda cantando e dançando, a montagem do cenário. O cenário é retirado das malas, baús e trouxas. A montagem do cenário deve ser realizada no tempo da música.
MÚSICA: CHEGANÇA
TODOS (EM OFF): A noite tá terminando
A lua já foi dormir
O galo tá avisando
O sol já vai surgir.
TODOS (ENTRANDO): Com licença, minha gente
Pedimos uma pousada
Nessa cidade linda
Cidade abençoada.
(MONTANDO O CENÁRIO)
Êta, cidade tão linda
Cidade que vai agradá.
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
Êta, cidade tão linda
Cidade que vai agradá.
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
TODOS: Nossa vida é na estrada.
Nossa vida é caminhar
Procura, mas não acha
Lugar de sossegar.
Sem sossego, sem parada.
É um comichão que dá
A estrada é nossa sorte.
Nossa razão de cantar.
Êta, cidade tão linda!
Cidade que vai agradá!
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
Êta, cidade tão linda!
Cidade que vai agradá!
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
Quem vive na estrada
O quê vai procurar?
Procura fortuna ou amor.
Procura sem encontrar
Quem procura e não acha
Sua sina encontrou...
A estrada vira casa.
Lugar que sempre amou.
Êta, cidade tão linda!
Cidade que vai agradá!
Essa gente da estrada!
Que vive pra lá e pra cá.
Êta, cidade tão linda!
Cidade que vai agradá!
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
Com licença, peço de novo,
Com licença d’eu me chegar!
Não vou ficar muito tempo
Que a estrada é o meu lugar.
Peço só um chãozinho
Pra mode me acomodar.
Recuperar minhas forças
Pra voltar a caminhar.
Êta, cidade tão linda!
Cidade que vai agradá!
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
Êta, cidade tão linda!
Cidade que vai agradá!
Essa gente da estrada
Que vive pra lá e pra cá.
(OS TRÊS ATORES PEGAM SUAS MALAS, BAÚS E TROUXAS E SAEM DE CENA. SIA MADALENA FICA NO PALCO).
SIA MADALENA: Opa, que a viagem foi boa! E olha eu chegando nessa cidade bonita! (PARA A PLATÉIA) Com um povo tão hospitaleiro! Dá licença, minha gente, que eu vou chegando... (PARA FORA DA CENA) Vam’bora, Mateus! Anda logo! (PARA A PLATÉIA) Compadre Mateus é meu marido! É mole esse homem!
COMPADRE MATEUS: (ENTRANDO – CARREGANDO UMA MALA) Calma, mulher! Que pressa é essa! Vai tirar o pai da forca?!
SIA MADALENA: Isso é jeito de fala, homem! Olha o povo aí!
COMPADRE MATEUS: (REPARANDO NA PLATÉIA E TIRANDO O CHAPÉU) Ah, ocês desculpem! Boas tardes! (SEGREDANDO P/ PLATÉIA) É que minha mulher parece que tem fogo nas pernas!
SIA MADALENA: Quê que tu ta falando aí, homem?
COMPADRE MATEUS: Nada, mulher...
COMPADRE JOÃO: (ENTRANDO – CARREGANDO UMA MALA) Boas tardes a todos! (VENDO O CASAL - SAUDANDO) Compadre Mateus!
COMPADRE MATEUS: (SAUDANDO) Compadre João!
(CORREM PARA O ABRAÇO)
COMPADRE MATEUS: De onde tá vindo, compadre?
COMPADRE JOÃO: Xiii! Venho de longe... Lá das outras bandas... (REPARANDO EM SIA MADALENA) Comadre Madalena, dê cá um abraço!
SIA MADALENA: (SEGREDANDO P/ A PLATÉIA E CAMINHANDO P/ O COMPADRE JOÃO) Olha aí, outro molenga! (OUTRO TOM) Como é que vai, compadre?
COMPADRE JOÃO: Como Deus qué! E vocês!
SIA MADALENA: Como Deus deixa! E essa lonjura toda de onde o compadre veio onde é que fica?
COMPADRE JOÃO: Ih, comadre! É longe... lá em Bom Jesus Del Rei...
COMPADRE MATEUS: Vixe, Maria! Não é que é longe mesmo!
COMPADRE JOÃO: E vocês? Vieram de onde?
SIA MADALENA: Lá das bandas do Gato Pelado...
COMPADRE JOÃO: Eta... Que também é uma lonjura!
COMPADRE JOSÉ: (ENTRANDO – CARREGANDO UMA MALA) Com licença que eu vou chegando!
OS OUTROS: (SAUDANDO) Compadre José!
(TODOS SE ABRAÇAM)
COMPADRE MATEUS: (P/ COMPADRE JOSÉ) Há quanto tempo, compadre José!
COMPADRE JOSÉ: Pois, não é! Bota tempo nisso! (P/ OS OUTROS - CUMPRIMENTANDO) Compadre João! Sia Madalena!
COMPADRE MATEUS: Veio de onde, compadre José?
COMPADRE JOSÉ: Vim lá de Rato Molhado!
COMPADRE JOÃO: É longe pra daná!
SIA MADALENA: (P/ COMPADRE JOSÉ) Cumprimente nossos anfitriões!
COMPADRE JOSÉ: (P/ PLATÉIA) Boas tardes, gente!
COMPADRE JOÃO: (P/ COMPADRE JOSÉ) E o quê que o senhor conta lá de Rato Molhado? Quais as novidades?
COMPADRE JOSÉ: Lá em Rato Molhado só se fala em um camarada...
SIA MADALENA: (INTERROMPENDO) Será que é o mesmo lá de Gato Pelado, Mateus?
COMPADRE MATEUS: Não pode ser...
COMPADRE JOSÉ: O povo lá só fala de um tal de Pedro Malasartes!
SIA MADALENA: E não é que é o mesmo!
COMPADRE MATEUS: Pois pode? Lá no Gato Pelado só se fala nesse moço!
COMPADRE JOÃO: Em Bom Jesus também! Não tem outro assunto. Só se fala nas esperteza de Pedro Malasartes!
COMPADRE JOSÉ: Mas esse homem tá em tudo que é lugar!
SIA MADALENA: E não tá, compadre? Diz que anda pelo mundo fazendo suas estripulias...
COMPADRE MATEUS: Não tem parada... não tem chão... vive daqui pra lá! Só enganando os trouxas!
COMPADRE JOSÉ: E como é que começou isso?
(COMPADRE MATEUS PEGA A VIOLA – OS OUTROS PEGAM INSTRUMENTOS DE PERCUSSÃO – A MÚSICA A SEGUIR DEVE SER UMA ESPECIE DE REPENTE)
MÚSICA: PEDRO MALASARTES I
TODOS: Como é essa história?
Quem é que vai contar?
Qual é a arte é boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Da arte sempre será.
Quem souber que conte.
Vamo’ logo começar..
COMPADRE MATEUS: Pois olhe que eu vou contar
Se ouve em toda parte
É história de esperteza.
É de Pedro Malasartes.
O menino tinha família:
Tinha pai, mãe e irmão.
Vivia sua vidinha
Como todo bom cristão.
O irmão que era mais velho
Um trabalho procurou.
Encontrou um fazendeiro
Que logo o contratou.
O patrão muito ladino
Ofereceu ao empregado
Um acordo diferente.
Coisa de malandro safado:
COMPADRE JOÃO (COMO O PATRÃO): Te dou um bom trabalho
Mas não gosto de falação
Nem a minha, nem a tua
Não quero reclamação.
Se um de nós reclamar
O castigo assim será:
Uma tira de couro
Das costas perderá.
TODOS: (NUM CALAFRIO) AAAAIIIIIIII!
TODOS: Pra onde vai essa história?
Aonde é que vai dar?
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Isso não vai mudar.
Quem souber que conte.
Pode continuar..
COMPADRE MATEUS: Isso é arte do tinhoso!
É coisa de gente má!
Uma proposta dessa
Não dá pra aceitar.
Mas o pobre do empregado
O acordo aceitou.
"São coisas dessa vida"
Assim o rapaz falou.
O malvado fazendeiro
Tratou de arrumar
Todo trabalho do mundo
Pro empregado reclamar.
Mas o pobre do empregado
Trabalhava sem cessar.
Mas um dia (Que dia!)
O rapaz não aguentou.
Sem força nenhuma
Do trabalho reclamou.
O fazendeiro sem piedade
Fez o combinado:
Tirou tira de couro
Das costas do coitado.
TODOS: (NUM CALAFRIO) AAAAIIIIIIII!
TODOS: Que maldade terrível.
Que raiva que dá!
Qual é a arte é boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Ele sempre será.
Quem souber que conte.
Vamo’ continuar...
COMPADRE MATEUS: Pra casa cabisbaixo
Voltou o empregado
Sem uma tira das costas
E o olho esbugalhado.
O caçula quando soube
Com muita raiva ficou.
Uma vingança medonha
Ele logo planejou.
Foi até a fazenda
E o fazendeiro encontrou.
Pediu um emprego
E assim escutou:
COMPADRE JOÃO (COMO O PATRÃO): Te dou um bom trabalho,
Mas não gosto de falação!
Nem a minha, nem a tua
Não quero reclamação.
Se um de nós reclamar
O castigo assim será.
Uma tira de couro
Das costas perderá.
TODOS: (NUM CALAFRIO) AAAAIIIIIIII!
TODOS: Pra onde vai essa história?
Aonde é que vai dar?
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Ele vai se vingar.
Quem souber que conte.
Pode continuar..
COMPADRE MATEUS: O Malasartes assim quis
E o trabalho começou.
O fazendeiro danado
Muito trabalho arranjou.
Sem nada reclamar,
Mas fazendo tudo errado
Malasartes trabalhava
De modo atrapalhado.
Vendeu os bois da fazenda
E com o dinheiro ficou.
Queimou o roçado
Até os porcos matou.
O fazendeiro ia firme
Até que não aguentou.
Botou a boca no mundo
O homem assim falou:
COMPADRE JOÃO (COMO O PATRÃO) Que bagunça é essa?
Que tanta enrolação.
Um empregado assim
Vai ser minha perdição.
Faço qualquer negócio.
Qualquer arrumação.
Só quero que vá embora.
Não quero ‘ocê aqui não!
TODOS: Essa história tem um fim?
Ela já vai terminar!
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Ele já se vingou.
Quem souber que conte.
Ponha um fim e acabou.
.
COMPADRE MATEUS: O Malasartes deu um sorriso.
Sorriso de lado a lado.
Não podia ir embora
Sem resolver o combinado.
Uma nova proposta
O Pedro fez ao patrão.
Queria muito dinheiro.
Muito dinheiro na mão.
Com medo de perder o couro
O fazendeiro aceitou.
Na mão do Malasartes
Muito dinheiro deixou.
O malandro foi embora
Ganhou rumo na estrada.
E essa história acabou.
Assim foi terminada.
TODOS: Essa história acabou,
Mas outra vai começar!
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Isso ninguém vai negar.
Quem souber conte outra.
Pode continuar.
COMPADRE JOSÉ: (TIRANDO DA MALA UM CHAPÉU) Pois então eu vou contar uma história de Pedro Malasartes que eu ouvi lá em Rato Molhado. Depois desse outro fato ocorrido, Malasartes voltou pra casa. Mas um fato quase mudou seu destino. A mãe do nosso Pedro estava muito doente. Quase, morre não morre!
TODOS: Que pena!
(DURANTE A PRÓXIMA FALA OS PERSONAGENS TIRAM DAS MALAS OBJETOS PARA SE TRANSFORMAR EM NOVOS PERSONAGENS DA HISTÓRIA E SAEM DE CENA)
COMPADRE JOSÉ: A pobre senhora num último fôlego pediu: queria que o filho caçula arrumasse uma ocupação. Um trabalho decente como todo bom cristão. Fez o pedido e foi pra terra dos pés juntos... bateu os canecos... bateu as botas... vestiu paletó de madeira... morreu! Malasartes, então, decidiu arrumar uma ocupação. E foi batendo de porta em porta atrás de emprego. (COLOCA O CHAPÉU) Eu agora sou o Malasartes! (BATE PALMAS) Ó de casa! Tem alguém aí?
(ENTRA SIA MADALENA. ELA AGORA É A FAZENDEIRA).
FAZENDEIRA: Pois não, moço! O que o senhor deseja?
MALASARTES I: Procuro um trabalho... uma ocupação... um serviço de bom cristão. Será que na sua fazenda não tem um lugar pra mim?
FAZENDEIRA: Talvez tenha, mas preciso falar com meu marido! (CHAMANDO) Marido!
(ENTRA COMPADRE JOÃO. ELE AGORA É O FAZENDEIRO).
FAZENDEIRO: Que é, mulher?
FAZENDEIRA: Esse moço tá procurando trabalho.
FAZENDEIRO: O que você sabe fazer?
MALASARTES I: Faço qualquer coisa... qualquer ocupação... Sabe, foi um pedido da minha finada mãezinha que eu arrumasse um serviço, um trabalho de bom cristão!
FAZENDEIRO: Trabalho até que tem. Não muito, mas tem. Só não tem dinheiro pra pagar. Somos muito pobres...
MALASARTES I: Trabalho por qualquer coisa. Até por um prato de comida!
FAZENDEIRO: Então está bem! Você vai ganhar um bom prato de comida todos os dias!
(ENTRA O COMPADRE MATEUS E SAEM OS OUTROS PERSONAGENS)
COMPADRE MATEUS: (ENTRANDO) E Malasartes passou a trabalhar na fazenda! E o patrão que disse que não tinha muito trabalho tratou de inventar um montão! O pobre do Malasartes trabalhava sem cessar!
(COMPADRE MATEUS SAI DE CENA. ENTRA O FAZENDEIRO PELO OUTRO LADO).
FAZENDEIRO: (CHAMANDO) Malasartes! Malasartes! Eu quero isso!
(MALASARTES I PASSA PELO FUNDO DO PALCO)
MALASARTES I: (CORRENDO) Já vai, patrão! (SAI DE CENA E VOLTA COM UMA ENORME PALAVRA – ISSO) Tá aqui, patrão!
FAZENDEIRO: (ANTES DE MALASARTES I ENTREGAR) Agora eu quero aquilo!
MALASARTES I: (SAI CORRENDO) Já vai, patrão! (VOLTA COM UMA ENORME PALAVRA – AQUILO) Tá aqui, patrão!
FAZENDEIRO: (ANTES DE MALASARTES I ENTREGAR) Agora eu quero “aquiloutro”!
MALASARTES I: (SAI CORRENDO) Já vai, patrão! (VOLTA COM UMA ENORME PALAVRA – AQUILOUTRO) Tá aqui, patrão!
FAZENDEIRO: (ANTES DE MALASARTES I ENTREGAR) Agora não quero mais! Demorou muito!
(O FAZENDEIRO SAI POR UMA COXIA E A FAZENDEIRA ENTRE PELA OUTRA. TRAZ NAS MÃOS UM PRATO COBERTO POR UM PANO).
MALASARTES I: (VENDO A FAZENDEIRA) Patroa! Patroa!
FAZENDEIRA: (TOM AGRESSIVO) Que é?
MALASARTES I: Trabalhei o dia todo. Tô cansado! Queria meu prato de comida...
FAZENDEIRA: (OUTRO TOM) Ah, meu filho, não temos nada pra lhe dar... somos muito pobres... só tem esse pãozinho... (TIRA O PANO E MOSTRA O PÃO)
MALASARTES I: (PEGANDO O PÃO) Se é só isso que tem pra comer... é o que vai ter que ser...
(A FAZENDEIRA SAI DE CENA)
MALASARTES I: (TENTANDO MORDER O PÃO) Nossa mãe! Que pão duro! Assim vou quebrar os dentes! (O GALO CANTA) Eta, o galo já cantou! Não tive tempo nem de dormir!
FAZENDEIRO: (CHAMANDO – EM OFF) Malasartes! Malasartes! Eu quero isso!
MALASARTES I: (CORRENDO) Já vai, patrão! (SAI DE CENA E VOLTA COM UMA ENORME PALAVRA – ISSO) Tá aqui, patrão!
FAZENDEIRA: (EM OFF) Malasartes, eu quero aquilo!
MALASARTES I: (SAI CORRENDO) Já vai, patroa! (VOLTA COM UMA ENORME PALAVRA – AQUILO)
FAZENDEIRO: (EM OFF) Malasartes, anda logo rapaz! Eu quero “aquiloutro”!
MALASARTES I: (SAI CORRENDO) Já vai, patrão! (VOLTA COM AS TRÊS PALAVRAS – ISSO, AQUILO E AQUILOUTRO) Patrão! Patroa! Tá aqui!
FAZENDEIRO E FAZENDEIRA: (EM OFF) Agora não queremos mais! Demorou muito!
MALASARTES I: (GUARDA AS PALAVRAS E LIMPA O SUOR DA TESTA) Ufa!! Tô trabalhando pra me danar! Será que não dá tempo de tomar um copo d’água? Eu vou lá buscar!
(ENTRA A FAZENDEIRA TRAZENDO DUAS SACAS CHEIAS DE OURO. ELA NÃO PERCEBE A PRESENÇA DO MALASARTES. O MALASARTES FICA DE LONGE A OBSERVAR).
FAZENDEIRA: (TIRANDO DA SACA UMA MOEDA DE OURO E ESFREGANDO COM UM PANINHO) Ai, meu ourinho... meu ourinho vai ficar brilhando! Ai, meu ourinho... meu ourinho vai ficar brilhando! Que beleza! Deixa eu guardar pra ninguém pegar! (SAI DE CENA LEVANDO AS SACAS)
MALASARTES I: Que safadeza! Que pouca vergonha! Aí, minha gente, esses dois se dizendo pobre e tendo esse monte de ouro na mão. E ainda me pagando com aquele pão velho e seco. (APONTA PARA O CÉU) Oh, minha finada mãezinha, a senhora vai me perdoar, mas esse negócio de serviço de bom cristão não é pra mim, não. Esses safados vão vê com quem tão lidando. Eu sou Pedro Malasartes!
FAZENDEIRO: (ENTRANDO) Pois é contigo mesmo que eu quero falar: eu quero que você vá a cidade busca isso...
MALASARTES I: (INTERROMPENDO) Patrão, esse negócio de busca ISSO, AQUILO, AQUILOUTRO... não é pra mim, não! Eu preferia ter uma ocupação só! Será que eu não posso tomar conta só dos porcos?
FAZENDEIRO: Você só quer tomar conta dos porcos?
MALASARTES I: É, patrão! Faz mal?
FAZENDEIRO: Bem não faz, mas mal também não chega a fazer! Você pode tomar conta só dos porcos, mas só vamos te dar a metade do pão!
MALASARTES I: Vindo do senhor e da patroa tá bem vindo.
FAZENDEIRO: Então, vamos lá pegar a vara de porcos!
(OS DOIS SAEM DE CENA. COMPADRE MATEUS ENTRA. TRAZ NA MÃO UM CHAPÉU).
COMPADRE MATEUS: (COLOCA O CHAPÉU) Eu agora sou um rico fazendeiro!
(ENTRA MALASARTES I TRAZENDO A VARA DE PORCOS)
MALASARTES I: Roinc... Roinc... Roinc... Roinc...Vamos, porquinhos! Roinc... Roinc... Roinc... Roinc...Vamos, meus bichinhos!
FAZENDEIRO RICO: Que belezura de porcos!
MALASARTES I: O senhor gostou? Eu também gosto muito dos meus bichinhos!
FAZENDEIRO RICO: São seus?
MALASARTES I: (PISCANDO PARA A PLATÉIA) São meus desde que nasceram! Eu adoro meus porquinhos!
FAZENDEIRO RICO: E o senhor não vende?
MALASARTES I: Vender os meus porquinhos? Acho que não, doutor!
FAZENDEIRO RICO: Venda! Pago bom preço por eles!
MALASARTES I: Mas eu vou sentir tanto a falta deles... só se eu ficasse com uma recordação...
FAZENDEIRO RICO: Que recordação?
MALASARTES I: O senhor quer os porquinhos pra criar ou pra matar?
FAZENDEIRO RICO: Pra matar e vender a carne!
MALASARTES I: Pois então eu vendo os porquinhos, mas sem o rabo. Vou ficar com os rabinhos de recordação!
FAZENDEIRO RICO: Como é que é?
MALASARTES I: O senhor não vai vender as carnes... o rabinho não vai fazer falta! E eu fico com uma recordação dos meus bichinhos! Só vendo assim!
FAZENDEIRO RICO: Que troço esquisito, mas tá bom! Vamos fazer negócio!
(O FAZENDEIRO RICO TIRA O DINHEIRO DO BOLSO E DA PARA O MALASARTES I)
MALASARTES I: (DANDO A VARA DE PORCOS PARA O FAZENDEIRO RICO) Agora o senhor segura os porquinhos que eu vou cortar os rabinhos.
(MALASARTES TIRA UM CANIVETE DO BOLSO E CORTA OS RABINHOS)
MALASARTES I: (CORTANDO) Doeu, bichinho? Tadinho! Doeu, meu filho? Pobrezinho...
(MALASARTES I CORTA TODOS OS RABOS)
FAZENDEIRO RICO: Então ficamos assim acertados! Boa tarde, amigo! (SAI)
MALASARTES I: Tarde! (MALASARTES I ESPERA O FAZENDEIRO RICO SAIR.) Agora esses safados vão saber quem é Pedro Malasartes! (ENFIA OS RABOS NUM CANTEIRO DO CENÁRIO E COMEÇA A GRITAR E PULAR). Patrão! Patrão! Pelo amor de Deus, patrão!
FAZENDEIRO: (ENTRANDO) Que foi, homem de Deus?
MALASARTES I: Os porquinhos!
FAZENDEIRO: Que você fez com meus porquinhos?
MALASARTES I: Os bichinhos tão se enterrando!
FAZENDEIRO: Que é isso? Que besteira é essa?
MALASARTES I: É verdade, patrão! Os bichinhos foram com as patinhas assim na terra... Roinc... Roinc... Roinc... Depois os focinhos... Roinc... Roinc... Roinc... E foram entrando na terra.. (APONTANDO) Olha lá, patrão! Só tá os rabinhos de fora!
FAZENDEIRO: Ai, que é verdade mesmo! O quê é que a gente faz, homem?
MALASARTES I: Tem que desenterrar eles!
FAZENDEIRO: Corre lá na casa e pede pra fazendeira uma pá!
MALASARTES I: Só uma?
FAZENDEIRO: Não. Pega logo duas!
MALASARTES: Duas. Tem certeza? São as duas?
FAZENDEIRO: Tenho, homem de Deus, pega as duas!
MALASARTES I: (ANDANDO E REPETINDO) As duas... né, patrão?! As duas...
(MALASARTES CHEGA DO OUTRO LADO DO PALCO)
MALASARTES I: (GRITANDO) Patroa! Patroa! Pelo amor de Deus, Patroa!
FAZENDEIRA: (ENTRANDO) Que é isso, homem?! Tá maluco?
MALASARTES I: (QUEBRA – TOM CALMO) O patrão mandou a senhora me dá as duas sacas de ouro.
FAZENDEIRA: Como é que é? Você tá é doido!
MALASARTES I: Eu não sei de nada, Patroa. O Patrão que mandou... A senhora quer ver? (CHAMANDO DE LONGE) Patrão! Patrão!
FAZENDEIRO: (DE LONGE) Que é?
MALASARTES I: (DE LONGE) São as duas, né? As duas!
FAZENDEIRO: (DE LONGE) É! As duas!
MALASARTES I: (P/ A FAZENDEIRA) A senhora viu? Não tô mentindo...
FAZENDEIRA: Pois olhe... Tô besta! Se é assim que ele quer, assim vai ser...
(ELA PEGA AS DUAS SACAS E ENTREGA A MALASARTES I. MALASARTES I PEGA AS SACAS E SAI POR UM LADO DO PALCO. DO OUTRO LADO ENTRA COMPADRE MATEUS. SIA MADALENA E COMPADRE JOÃO TIRAM OS ADEREÇOS DOS OUTROS PERSONAGENS).
COMPADRE MATEUS: O Fazendeiro e sua mulher nunca mais viram o ouro, nem os porcos, nem o Pedro Malasartes!
(COMPADRE JOSÉ VOLTA A CENA COM O CHAPÉU DE MALASARTES NA MÃO – TODOS CANTAM)
MÚSICA: PEDO MALASARTES II
TODOS: Essa história acabou,
Mas outra vai começar!
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Isso ninguém vai negar..
Quem souber conte outra.
Pode continuar.
(COMPADRE JOÃO PEGA O CHAPÉU DE COMPADRE JOSÉ. OS OUTROS PERSONAGENS SE ARRUMAM PARA A CENA. A HISTÓRIA SERÁ TODA CANTADA. SIA MADALENA E COMPADRE MATEUS TOCARÃO OS INSTRUMENTOS. COMPADRE JOSÉ SERÁ O MOÇO DOUTOR. ELE SAI DE CENA PARA SE ARRUMAR).
COMPADRE JOÃO:Outra história do Malasartes
Agora eu contarei!
Essa eu ouvi lá longe
Em Bom Jesus Del Rei.
Pois acredite, minha gente,
O Malasartes por lá andou.
E quando chegou na cidade
Ele assim falou:
(COMPADRE JOÃO COLOCA O CHAPÉU - ELE AGORA É O MALASARTES II)
MALASARTES II: Depois de enganar
Os fazendeiros safados
Gastei o dinheiro
Tô sem um trocado.
Vim pará nessa terra
Pra mode consegui
Um dinheirinho fácil
Pra poder me divertir.
Mas essa estrada não tem
Uma criatura se quer!
Por aqui não passa
Bicho, homem ou mulher.
(MALASARTES II REPARA NUM MONTE DE COCO NO MEIO DO PALCO)
MALASARTES II: Mas olhe que eu tô enganado
Dessa minha afirmação
Passou por aqui com certeza
Um grande porcalhão!
Se bicho, homem ou mulher
Não posso afirmar.
Mas a prova da passagem
Aqui deixou ficar.
Deve ter comido
Em outro lugar
Um farnel gostoso
Bom de saborear.
Descomeu aqui,
No meio da estrada,
Deixando essa porqueira
Coisa mal acabada.
Mas uma ideia me veio
Desse coco da estrada.
Vou ganhar um dinheiro
Pra gastar com a mulherada.
Deve passar por aqui
Doutor, bispo e fazendeiro.
Gente boa de enganar
E que tem muito dinheiro.
Vou ficar por aqui
Só a esperar
Não demora muito
Alguém vai passar.
CORO: O quê é que Malasartes
Agora vai aprontar?
Dessa vez eu acho
Ele vai se estrepar.
Que será essa arte?
Será boa ou má?
Vamos ver, minha gente,
No que é que vai dar!
(MALASARTES COBRE O COCO COM O CHAPÉU E FICA DE CÓCORAS SEGURANDO AS ABAS COMO SE PRENDESSE ALGUMA COISA. ENTRA COMPADRE JOSÉ – ELE AGORA É O MOÇO DOUTOR – VEM MONTADO NO SEU CAVALO).
MOÇO DOUTOR: Sou Moço Doutor
Letrado na capital.
Sou muito inteligente,
Esperto, coisa e tal.
Aqui nessa terra
A burrice é geral.
Só tem bobalhão.
Só tem capial.
(REPARA NO MALASARTES)
Pois olhe lá!
Eu não tô falando.
Sentado na estrada
O chapéu segurando.
Que fará esse bobo
Sentado sozinho?
Fica na estrada
Atrapalhando o caminho.
(PARA O MALASARTES II)
Ei, você aí
Sentado sozinho.
Quê tá fazendo?
Saia do caminho!
MALASARTES II: Desculpe atrapalhar,
Seu Moço Doutor.
Tô segurando uma joia
Coisa que é um primor!
MOÇO DOUTOR: Esse chapéu velho,
Sujo e encardido.
Isso é primor aonde?
Isso é coisa de bandido!
(MALASARTES PISCA P/ A PLATÉIA)
MALASARTES II: Não falo do chapéu.
Falo do que tem dentro.
Um lindo passarinho.
Um verdadeiro talento!
MOÇO DOUTOR: Pois levante o chapéu
E me mostre o bichinho.
Quero ver o talento
Desse passarinho!
MALASARTES II: Se o chapéu levantar
Ele vai voar.
Sem o lindo passarinho
Eu vou ficar!
MOÇO DOUTOR: Então ponha o bichinho
Gaiola adentro.
Pra gente apreciar
Belezura e talento!
MALASARTES II: Mas seu moço doutor,
Gaiola não tenho não.
Só tenho esse chapéu
Sujo e lambão.
MOÇO DOUTOR: Pois então vá comprar
Vá comprar agora
Uma boa gaiola
Pra essa ave canora!
MALASARTES II: Se eu pudesse, doutor,
Bem que ia comprar.
Mas não tenho dinheiro.
Não tenho onde arranjar.
MOÇO DOUTOR: Pois se esse é o problema
Eu lhe dou o dinheiro.
Quero ver o passarinho
Cantar bem faceiro.
MALASARTES II: Seu Moço Doutor,
Isso pode ficar caro.
É coisa especial!
Um passarinho raro.
O bichinho não fica
Em gaiola qualquer.
Tem que ser da boa.
A melhor que tiver.
MOÇO DOUTOR: Pois estou mandando.
Chega de zoada.
Quero a melhor gaiola!
A mais enfeitada!
Bonita e grande
Com poleiro dourado.
Pro lindo passarinho
Soltar seu trinado!
MALASARTES II: Se o doutor assim quer...
Assim feito será!
Mas segure o chapéu
Pro pássaro não voar.
(O MOÇO DOUTOR DESMONTA DO CAVALO E FICA DE CÓCORAS NO LUGAR DE MALASARTES – O CORO CANTA NESTE MOVIMENTO)
CORO: Não é que Malasartes
Enrolou o Moço Doutor.
Tanta esperteza é arte
É coisa de professor!.
Agora vamos saber
Que outra aprontação.
Fará Pedro Malasarte
Para o Doutor Bobão!
MALASARTES II: O Doutor segure bem
Vou numa carreira só!
Mas devo demorar...
A venda é longe, dá dó.
Indo de pé a pé
A estrada fica comprida.
Se tivesse outro jeito
De fazer essa corrida!
MOÇO DOUTOR: Vá no meu cavalo
Veloz e ligeiro.
Aqui nesse bolso
Você pegue o dinheiro.
(MALASARTES II PEGA O DINHEIRO E MONTA NO CAVALO)
MOÇO DOUTOR: Anda logo, matuto,
Deixa de enrolação.
Quero ver o bichinho
Soprar uma canção.
Vai depressa, matuto,
Deixa de moleza.
Quero ver o bichinho
Cantar que é uma beleza
(MALASARTES II SAI NO GALOPE)
MOÇO DOUTOR: Agora que se foi
O bobalhão capial
Vou pegar o passarinho
Pra cantar no meu quintal!
(MOÇO DOUTOR FAZ MENÇÃO DE PEGAR O PASSARINHO – O CORO CANTA)
CORO: Agora quero ver
O Moço Doutor se danar.
Achou que era esperto
Ele vai se estrepar.
Mexeu com Malasartes,
Mestre na esperteza,
A história termina assim
Pode ter certeza!
(O MOÇO DOUTOR ENFIA A MÃO POR DENTRO DO CHAPÉU E LEVANTA TUDO DE UMA VEZ SÓ.)
MOÇO DOUTOR: Mas é cocô! Amarelo filho de uma égua!
(O MOÇO DOUTOR DÁ UM GRITO E SAI CORRENDO – VOLTA COMPADRE JOÃO COM O CHAPÉU NA MÃO).
COMPADRE JOÃO: É o Moço Doutor nunca mais viu o Malasartes, nem seu cavalo, nem seu dinheiro...
(VOLTA COMPADRE JOSÉ – TODOS CANTAM)
MÚSICA: MALASARTES III
TODOS: Essa história acabou,
Mas outra vai começar!
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Isso ninguém vai negar...
Quem souber conte outra
Pode continuar.
SIA MADALENA: (PEGA O CHAPÉU DE COMPADRE JOÃO) Pois agora quem vai contar sou eu. Essa foi uma das histórias que eu mais meu marido escutamos lá no Gato Pelado. Diz que o Pedro Malasartes andava lá pelas bandas de Gato Pelado, até que parou numa birosca. Ficou reparando na conversa de compadres com o dono da birosca. E eles assim diziam:
(SIA MADALENA COLOCA O CHAPÉU. ELA AGORA É O MALASARTES III. FICA REPARANDO NA CONVERSA. COMPADRE MATEUS E COMPADRE JOSÉ SÃO OS DOIS COMPADRES, COMPADRE JOÃO É O DONO DA BIROSCA).
COMPADRE I: Aquela velha é terrível!
COMPADRE II: Aquilo é sovina que Deus me livre e guarde!
DONO DA BIROSCA: Ô...
COMPADRE I: Não dá bom dia pra não gastar a língua!
COMPADRE II: Pior. Ela não dá nem adeus. Porque balança a mão e ela pode perder os dedos!
DONO DA BIROSCA: Ô...
COMPADRE I: É uma sovina!
COMPADRE II: Mão de vaca!
DONO DA BIROSCA: Ô...
MALASARTES III: (SE INTROMETENDO) Tarde! Cês tão falando de quem?
COMPADRE I: Duma velha pão-dura...
COMPADRE II: Ela mora aqui por perto!
DONO DA BIROSCA: Ô...
MALASARTES III: E ela não dá nada pra ninguém?
COMPADRE I: Não dá...
COMPADRE II: Nem compra!
DONO DA BIROSCA: Ô...
MALASARTES III: Pois olhe, que eu vou fazer essa velha me dar de comer hoje!
(OS DOIS COMPADRES E O DONO DA BIROSCA COMEÇAM A RIR. MALASARTES III SÓ FICA OLHANDO).
COMPADRE I: Pois essa eu quero ver!
COMPADRE II: Essa eu duvido!
DONO DA BIROSCA: Ô...
COMPADRE I: Um amarelo desse...
COMPADRE II: Eu pago pra ver!
DONO DA BIROSCA: Ô...
MALASARTES III: Então está feita a aposta!
COMPADRES: Está combinado!
DONO DA BIROSCA: Ô...
COMPADRE I: Pois eu aposto tanto! (TIRA O DINHEIRO DO BOLSO)
COMPADRE II: E eu mais esse tanto! (TIRA O DINHEIRO DO BOLSO)
DONO DA BIROSCA: (NEGANDO PARTICIPAÇÃO) Ô...
MALASARTES III: Pois eu coloco o seu tanto e o tanto dele!
(OS TRÊS ENTREGAM O DINHEIRO NA MÃO DO DONO DA BIROSCA)
DONO DA BIROSCA: (PEGA O DINHEIRO E SAI) Ô...
MALASARTES III: Agora ocês tem que me dizer onde mora a tal velha!
COMPADRE I: É fácil...
COMPADRE II: É aqui pertinho!
COMPADRE I: (MOSTRANDO) Você segue por essa rua..
COMPADRE II: Até o fim!
COMPADRE I: Vira a direita na pedra grande...
COMPADRE II: Depois anda mais três quadras...
COMPADRE I: Aí quebra pra esquerda e logo pra direita...
COMPADRE II: Sobe o morrinho...
COMPADRE I: E depois desce...
COMPADRE II: Anda mais duas quadras...
COMPADRE I: E quebra de novo à direita e a esquerda...
COMPADRE II: E chegou! É a casa no alto da ladeira!
MALASARTES III: Mas é muito longe...
COMPADRE I: A gente vai fazer melhor...
COMPADRE II: Vai levar você até lá!
(OS TRÊS DÃO UMA VOLTA NO PALCO E PARAM NO MESMO LUGAR)
COMPADRE I: Pronto já chegou...
COMPADRE II: (APONTA) É aquela casa ali!
MALASARTES III: Já chegou! Então vocês se escondem que eu vou dar um jeito nessa velha!
(OS DOIS SAEM. MALASARTES TIRA DA BOLSA UMA PANELA VELHA E UMA COMPRIDA TIRA DE PANO AZUL. ESTICA A TIRA NO CHÃO. DETRÁS DA CASA APONTADA SURGE A VELHA – É UM BONECO MANIPULADO POR COMPADRE MATEUS E COMPADRE JOSE. MALASARTES TIRA DA BOLSA UMA FOGUEIRA JÁ ACESA E COLOCA NO CHÃO).
VELHA: (A VOZ DA VELHA DEVE SER FEITA POR UM DOS COMPADRES QUE A MANIPULAM OU POR COMPADRE JOÃO) O quê esse homem tá fazendo perto do meu riacho?
(MALASARTES PEGA A TIRA AZUL E COLCA DENTRO DA PANELA)
VELHA: Botou água do riacho na panela! Eu acho que ele vai fazer comida. Eu é que não vou dar nenhum uma ajudinha pra esse malandro! Mas o que será que ele vai cozinhar?
(MALASARTES COMEÇA A PROCURAR. ATRÁS DAS OUTRAS CASAS ELE ACHA PEDRAS. PEGA UMA, LIMPA E COLOCA NA PANELA. PEGA OUTRA CHEIRA E JOGA FORA. FAZ ISSO VÁRIAS VEZES ATÉ JUNTAR QUATRO PEDRAS. DEPOIS ELE FICA AGAICHADO MEXENDO A PANELA COM UM PAUZINHO)
VELHA: O quê é que esse doido tá fazendo com essas pedras? (A VELHA ESTICA O PESCOÇO – O BONECO DEVE TER UM MECANISMO QUE FAÇA O PESCOÇO ESTICAR) Eu não consigo ver daqui... (ESTICA MAIS) Não consigo mesmo... (ESTICA MAIS) Não dá jeito... Eu vou até lá! (P/MALASARTES III) Tarde, amigo.
MALASARTES III: Tarde...
VELHA: Se o amigo não se incomodá, podia me dizê o que é que tá fazendo?
MALASARTES III: Tô cozinhando!
VELHA: (OLHA P/ DENTRO DA PANELA) Mas é pedra que tem aí dentro!
MALASARTES III: E é. Eu tô fazendo uma sopa!
VELHA: Sopa de pedra? Nunca vi disso!
MALASARTES III: (PISCA P/ A PLATÉIA) A senhora nunca comeu sopa de pedra? Olha, não sabe o que está perdendo.
VELHA: E é bom?
MALASARTES III: Se é bom? Aprendi a fazer a sopa com minha finada mãezinha. Ela fazia pra nós, quando nós era criança. Dona... o gosto... olha, não dá nem pra falá. É maravilhoso. Chega eu tô com água na boca só de pensa que eu vou comê. Ai, meu Deus!
VELHA: Humm... eu também tô ficando com água na boca!
MALASARTES III: Mas é claro que tem ficá! É um sabor que a senhora nunca provou na vida!
VELHA: Tô com a boca cheia d’água!
MALASARTES III: Se bem, que essa não vai ser... aquela... por que falta uns temperinhos. Mas vai tá boa também.
VELHA: Só uns temperinho....
MALASARTES III: Só.
VELHA: Não seja por isso. Eu arranjo tempero.
(A VELHA VAI A CASA E TRAZ OS TEMPEROS E ENTREGA A MALASARTES. ESSE MOVIMENTO DEVE SER BEM RÁPIDO E MARCADO POR UMA PERCUSSÃO).
MALASARTES III: Agora sim. Um manjericãozinho fresco! Que Beleza! Esse manjericão tá me fazendo lembrar sabe de quem, dona?
VELHA: Não! De quem?
MALASARTES III: Do meu tio Totonho!
VELHA: Ah é?
MALASARTES III: Meu tio Totonho... Lembro tanto dele. Já morreu! Ele adorava essa sopa com uns temperinho! O bichinho chegava a babá! Se tivesse uns tomatinho, então... Ih!! Ele se babava todo! Mas essa também vai fazer lembrar dele...
VELHA: Só uns tomatinhos?
MALASARTES III: Só!
VELHA: Não seja por isso. Quantos tomate?
MALASARTES III: Quatro. Dos grande.Cortado em rodela.
(A VELHA VAI A CASA E TRAZ O PEDIDO E ENTREGA A MALASARTES. ESSE MOVIMENTO DEVE SER BEM RÁPIDO E MARCADO POR UMA PERCUSSÃO).
VELHA: E agora? Falta muito pra ficá pronto?
MALASARTES III: Falta. Se tivesse um macarrãozinho pra ajudá no cozimento, mas a gente tem paciência e espera...
VELHA: Só um macarrãozinho?
MALASARTES III: Só!
VELHA: Não seja por isso.
(A VELHA VAI A CASA E TRAZ O PEDIDO E ENTREGA A MALASARTES. ESSE MOVIMENTO DEVE SER BEM RÁPIDO E MARCADO POR UMA PERCUSSÃO).
MALASARTES III: Ai, dona, vendo essa sopa me deu uma saudade da minha finada mãezinha. Ela adorava essa sopa. Com tocinho de fumero e umas carninha magra pra complementá, ela chegava a lamber os beiços. Mas essa vai fazer lembrar dela também...
VELHA: Só uns toucinho e umas carninha magra?
MALASARTES III: Só!
VELHA: Não seja por isso.
(A VELHA VAI A CASA E TRAZ O PEDIDO E ENTREGA A MALASARTES. ESSE MOVIMENTO DEVE SER BEM RÁPIDO E MARCADO POR UMA PERCUSSÃO).
VELHA: Quando ficá pronto, o senhor me dá um pouquinho pra eu experimentá?
MALASARTES III: Claro! Mas a senhora arruma uns pratinho, porque nós dois não vamos comê nessa panela.
VELHA: Não seja por isso.
(A VELHA VAI A CASA E TRAZ O PEDIDO E ENTREGA A MALASARTES. ESSE MOVIMENTO DEVE SER BEM RÁPIDO E MARCADO POR UMA PERCUSSÃO. O MALASARTES PÕE UM POUQUINHO NO PRATO DA VELHA E ENCHE O SEU. OS DOIS COMEM. ESSES MOVIMENTOS DEVEM SER FEITOS COM MÍMICA E PERCUSSÃO.).
MALASARTES III: Gostô?
VELHA: Gostei. Mas e as pedras?
MALASARTES III: As pedras? As pedras a gente joga fora! Eu não sou doido pra comer pedra!
(A VELHA DÁ UM GRITO DE RAIVA E CORRE ATRÁS DO MALASARTES. SAEM DE CENA. COMPADRE JOÃO ENTRA DO OUTRO LADO).
COMPADRE JOÃO: E assim Malasartes enganou a velha. Passou na birosca, pegou o dinheiro da aposta e acabou a história.
(VOLTAM TODOS. SIA MADALENA COM O CHAPÉU NA MÃO – TODOS CANTAM).
MÚSICA: MALASARTES IV
TODOS: Essa história acabou,
Mas outra vai começar!
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Isso ninguém vai negar...
Quem souber conte outra.
Pode continuar.
(COMPADRE MATEUS PEGA O CHAPÉU DE SIA MADALENA)
COMPADRE MATEUS: Pois eu vou continuar e é uma história meio triste. Pois contam também em Gato Pelado que o Pedro Malasartes foi para o céu...
OS OUTROS: (INTERROMPENDO) Ele morreu!
COMPADRE MATEUS: Não! Ele só queria ver como eram as coisas por lá! O Malasartes estava cansado de fazer tanta aprontação por aqui e resolveu ir pro céu! Queria ver como eram as coisas por lá! Queria saber se todo mundo era bom mesmo lá no céu ou era só enganação. E também palestrar com seus santos de devoção. Principalmente com Jesus e com a Virgem Maria. Mas o pobre teve que andar muito pra chegar no céu. Porque o céu é longe. E bota longe nisso. Foi uma canseira... uma verdadeira ladainha.... uma romaria... uma procissão sem fim....
(COMPADRE MATEUS COMEÇA A TOCAR UM SINO OU UM TRIANGULO. OS OUTROS ATORES VESTEM ROUPAS DE ANJO E COMEÇAM A ARRUMAR O CENÁRIO QUE SERÁ O CÉU. COMPADRE MATEUS CANTA ACOMPANHADO PELOS ANJOS).
MÚSICA: CHEGADA NO CÉU
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh. oh, oh!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
No céu quero encontrar
A paz dos meus lamentos
No céu devo encontrar
Conforto dos meus tormentos
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Conversar com os santos todos:
Benedito, Antonio e João.
Conversar com gente boa.
Com gente de correção.
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Com os anjos e os arcanjos
Cercado de alegria!
Encontrar com bom Jesus.
Com o filho de Maria!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
No céu não tem tormento.
No céu só harmonia.
Um eterno bom viver.
Uma vida de alegria.
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
No céu quero encontrar
A paz dos meus lamentos.
No céu devo encontrar
Conforto dos meus tormentos.
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh!
Oh, oh, oh, oh, oh!
(DEPOIS DE ARRUMAR O CENÁRIO NO FIM DA MÚSICA, OS ANJOS ENTRAM COM UM ENORME BONECO. É SÃO PEDRO. SIA MADALENA FAZ A VOZ DE SÃO PEDRO. COMPADRE MATEUS COLOCA O CHAPÉU DE MALASARTES – A CENA É FEITA NA FRENTE DO PALCO).
MALASARTES IV: (PARECE CANSADO – FALA P/ PLATÉIA) Nossa! Como eu andei para chegar aqui! Pois é, minha gente, eu tava cansado de tanta aprontação lá na terra. Resolvi vim conhecer o céu. Mas eu só quero dar uma olhada, bater um papo com Santo Antonio, com São João, com Santo Expedito. E quero muito conhecer a mãe de todos. A nossa Virgem Maria! A minha Mãezinha de coração! (REPARANDO) Mas olha quem tá na porta, pra me receber... É São Pedro! O chaveiro do céu! Vixe, como ele é grande! (CUMPRIMENTANDO) Tarde, São Pedro!
SÃO PEDRO: Boa tarde, meu filho!
MALASARTES IV: Desculpe, eu lhe falá, mas o senhor é muito grande!
SÃO PEDRO: Somos todos grandes aos olhos de Deus!
MALASARTES IV: Não sei quanto ao olho de Deus, mas pro meu olho o senhor está grande pra caramba! O senhor desculpe, mas eu posso falar outra coisa?
SÃO PEDRO: Pode, meu filho!
MALASARTES IV: A sua voz é muito fina! Parece voz de mulher!
SÃO PEDRO: Somos todos iguais aos olhos de Deus!
MALASARTES IV: É, né? Tá bom...
SÃO PEDRO: Mas o quê o filho deseja aqui? Acho que ainda não chegou sua hora!
MALASARTES IV: Eu sei, São Pedro! Mas é que eu tava tão cansado de tanta aprontação lá na Terra que eu queria dar uma olhada como é que são as coisas aí no céu! Podia até conversar com alguns santos, conhecer a Virgem Maria e quem sabe palestra com o homem... o próprio Jesus! Se não for pedir de mais!
SÃO PEDRO: Mas não chegou sua hora, meu filho! E quem entra no céu não pode mais sair!
MALASARTES IV: Não pode sair?
SÃO PEDRO: Não!
MALASARTES IV: Ninguém?
SÃO PEDRO: Ninguém!
MALASARTES IV: Mas Jesus não foi pro céu e voltou no terceiro dia?
SÃO PEDRO: Isso é lá com Jesus! Ele manda por aqui!
MALASARTES IV: Até no céu os poderosos tem regalia!
SÃO PEDRO: Pedro Malasartes, não fale isso!
MALASARTES IV: O senhor sabe meu nome?
SÃO PEDRO: Aqui no céu nos sabemos de tudo!
MALASARTES IV: Ah é, então como é o nome daquela menina que tá sentada na terceira fila? (APONTA)
SÃO PEDRO: Aquela menina? Quê menina?
MALASARTES IV: Viu, o senhor não sabe! Então como o senhor não sabe de tudo, podia me deixar entrar um pouquinho...
SÃO PEDRO: Não, Malasartes! Quem entra aqui não sai! E só entra quando está na hora!
MALASARTES IV: Deixa, São Pedro! O senhor é meu xará!
SÃO PEDRO: Só pode entrar quando estiver na hora!
MALASARTES IV: E se não tiver na hora? Não pode ficar aí dentro?
SÃO PEDRO: Ô meu filho, se não pode nem entrar, como é que vai poder ficar aqui dentro?
MALASARTES IV: Entendi. (MALASARTES PISCA PARA A PLATÉIA) São Pedro, tá uma ventania aqui!
SÃO PEDRO: Eu não estou sentindo nada.
MALASARTES IV: O senhor aí de cima não pode sentir nada. Tá fazendo até barulho, escuta só: VUUUUUUUUUUU! VUUUUUU!
(MALASARTES COMEÇA A BALANÇAR COMO SE ESTIVESSE SENDO LEVADO PELO VENTO)
SÃO PEDRO: Mas eu não estou sentindo nada!
MALASARTES IV: O vento tá muito forte! Vai levar o meu chapéu! VUUUUU! VUUUUUU!
(MALASARTES PEGA O CHAPÉU E ATIRA PARA DENTRO DO CÉU)
MALASARTES IV: Ai, meu chapéu novinho! Tenho que pegar ele!
(SÃO PEDRO TENTA IMPEDIR, MAS MALASARTES ENTRA NO CÉU).
SÃO PEDRO: Você não pode ficar aqui dentro!
MALASARTES IV: Agora que eu já tô vou conversar um pouco com os santos. (ACENANDO) Santo Antonio! Ô, Santo Antonio!
(MALASARTES CORRE PARA UMA COCHIA E SÃO PEDRO VAI ATRÁS – ESSA CENA É UM CORRE-CORRE, UM ENTRA E SAI DE COCHIA. MUITO BARULHO E CONFUSÃO).
SÃO PEDRO: Você não pode ficar aqui!
MALASARTES IV: (VOLTANDO) Santo Expedito, meu querido! (SAI)
SÃO PEDRO: (VOLTANDO ATRÁS DE MALASARTES) Você não pode ficar aqui! (SAI)
MALASARTES IV: (VOLTANDO) São João! Viva São João! (SAI)
SÃO PEDRO: (CORRENDO) Volta, Malasartes, você não pode ficar aqui! (SAI)
MALASARTES IV: (VOLTANDO) Olha o Arcanjo Gabriel! Que belezura de asa! (SAI)
SÃO PEDRO: (CORRENDO) Malasartes! (SAI)
MALASARTES IV: (VOLTANDO) Minha Nossa Senhora! Minha Virgem Maria! (SAI)
SÃO PEDRO: (CORRENDO) Malasartes! (SAI)
(O ENTRA E SAI E GERAL. ATÉ QUE OS DOIS SE ENCONTRAM NO MEIO DO PALCO. SÃO PEDRO ESTÁ CANSADO E MALASARTES ESTÁ FELIZ DA VIDA – LEVA NAS MÃOS UM MONTE DE PAPÉIS).
SÃO PEDRO: (BUFANDO) Mas isso é coisa que se faça! Ficar correndo pelo céu!
MALASARTES IV: Mas eu queria pegar o autógrafo dos meus santos queridos! (MOSTRA) Peguei de Santo Antonio... São Marcos... Santo Expedito... e esse é o mais importante... È o autógrafo da Virgem Maria!
SÃO PEDRO: Isso aqui não é show para você ficar pegando autógrafo!
MALASARTES IV: Ih, o senhor está muito nervoso! É melhor eu ir embora!
SÃO PEDRO: Ir embora? Como? Você não pode sair!
MALASARTES IV: Mas o senhor não disse que eu não podia ficar?
SÃO PEDRO: Mas já que entrou não pode sair!
MALASARTES IV: Agora vá entendê! O senhor ficou o tempo todo atrás de mim dizendo que eu não podia ficá! Agora eu não posso saí?
SÃO PEDRO: Mas você entrou no céu...
MALASARTES IV: Entrei no céu pra pegá meu chapéu!
SÃO PEDRO: Pois não devia ter entrado! E agora não vai sair de jeito nenhum!
MALASARTES IV: Mas não chegou a minha hora!
SÃO PEDRO: Não interessa! Agora que entrou não vai mais sair! Quem manda aqui sou eu!
MALASARTES IV: Tá certo! O senhor é quem manda aqui, então eu vou ficar!
SÃO PEDRO: É isso mesmo!
MALASARTES IV: E quando perguntarem eu vou dizer que foi o senhor que mandou!
SÃO PEDRO: Isso mesmo!
MALASARTES IV: Eu só quero ver a cara do Todo Poderoso... Do Messias... de Jesus de Nazaré quando der comigo por aqui. Um sujeito como eu... Que nem está na hora! Pode deixar que eu digo que foi o senhor que mandou. Eu acho que ele vai compreender!
SÃO PEDRO: Eh... Humm... Ahn...
MALASARTES IV: Ele não vai ficar nem um pouco chateado! Ainda mais sabendo que é ordem sua. Afinal, quem manda aqui é o senhor, né?
SÃO PEDRO: Eh... Ahn... Você não vai dizer isso para Jesus?
MALASARTES IV: Mas é claro que vou!
SÃO PEDRO: Então pode ir embora, Malasartes.
MALASARTES IV: Ah, não, agora eu quero ficá! Quero ver a cara de Jesus quando ele souber quem manda aqui de verdade!
SÃO PEDRO: Malasartes, vai embora...
MALASARTES IV: Se o senhor manda...
SÃO PEDRO: (FURIOSO) Vai embora, Malasartes! (SAI BATENDO PÉ)
MALASARTES IV: O senhor mandou... eu vou embora!
(COMPADRE MATEUS TIRA O CHAPÉU)
COMPADRE MATEUS: E o Malasartes enganou até o santo! São Pedro ficou furioso, mas depois esqueceu. E o Pedro Malasartes voltou pra Terra e continuou suas estripulias por aqui! Diz que ele anda pelo mundo todo fazendo aprontação, mas isso já é outra história!
(OS OUTROS ATORES VOLTAM - FALAM JUNTOS)
TODOS: (A FALA É RITMADA) Nossa história acabou,
Mas outras vão começar!
Qual é a arte boa?
Qual é a arte má?
Que Pedro é Malasartes.
Isso ninguém vai negar.
Vamos seguir na estrada.
Ela vai nos levar.
Deixamos aqui com certeza
Um pedaço do coração.
Agradecendo a gentileza
E a boa educação
Dessa gente bonita.
Desse povo feliz
Que ouviu nossa história
Sem torcer o nariz
COMPADRE MATEUS: Então, vamos embora minha gente!
(TODOS CANTAM E DESMONTAM O CENÁRIO)
MÚSICA: DESPEDIDA
TODOS: Nossa vida é na estrada.
Nossa vida é caminhar.
Procura, mas não acha
Lugar de sossegar.
Sem sossego, sem parada,
É um comichão que dá
A estrada é nossa sorte.
Nossa razão de cantar.
Êta, cidade tão linda;
Cidade que vai deixar
Uma saudade no peito.
Uma vontade de voltar.
Êta, cidade tão linda.
Cidade que vai deixar
Uma saudade no peito.
Uma vontade de voltar
Contamos aqui com certeza
Histórias do Malasartes.
História de muita esperteza.
História com muita arte.
Quem quiser passar adiante
Não se acanhe, por favor.
Pode contar as histórias.
Pode ser um contador.
Êta, cidade tão linda.
Cidade que vai deixar.
Uma saudade no peito.
Uma vontade de voltar.
Êta, cidade tão linda.
Cidade que vai deixar.
Uma saudade no peito.
Uma vontade de voltar.
Agradecendo esse povo
Que ouviu com atenção.
As histórias foram contadas
Do fundo do coração.
Agradecendo de novo
E pedindo com fervor
Daqueles que gostaram
Aplausos, por favor.
Êta, cidade tão linda.
Cidade que vai deixar.
Uma saudade no peito.
Uma vontade de voltar.
Êta, cidade tão linda.
Cidade que vai deixar.
Uma saudade no peito.
Uma vontade de voltar.
FIM